QUO NON ASCENDAM ?
(Até onde
chegarei?)
(inscrição no Brasão de Armas de Guará, SP)
("Brasão de Armas" - Guará, SP -
fonte:https://pt.wikipedia.org/wiki/Bras%C3%A3o_de_Guar%C3%A1 )
15 de setembro é o dia de
aniversário de fundação de Guará, minha terra natal. Desde que saí de lá para a
universidade não sei como foi nem como tem sido comemorado esse dia. Lembro-me
que havia um desfile escolar, jogos de futebol, gincana cultural. Às vezes as
comemorações estendiam-se por alguns dias e a cidade embelezava-se toda para
aniversariar...
No ano de 1991, durante as
festividades de aniversário da cidade, recebi da Prefeitura Municipal um
convite para participar da cerimônia de descerramento de uma placa que atribuia
o nome de um dos meus tios a uma escola. E lá estive eu.
(Convite recebido - arq. pessoal)
Olhando hoje o convite, fiquei me
lembrando desse meu tio e das pessoas com quem conversei naquela noite durante
a cerimônia.
Meu tio era um intelectual e
sonhador. Gostava muito de Guará; falava de Guará com paixão. Queria que o
município oferecesse oportunidades de desenvolvimento e de cultura para toda a
sua população. Vivia inserindo e inspirando
raciocínio crítico, educação, música, literatura, administração pública
e participação política em todas as pessoas com quem conversava. Estar com ele
era receber estímulos de conhecimento. Penso que foi justamente por ele ter
sido assim que o Município decidiu atribuir a uma instituição educacional o seu
nome: Náufal Antônio Mourani. Ele passaria a ser então, formalmente, uma
referência para a população de Guará.
Durante a cerimônia, ao meu lado,
o Sr. N. – um dos guaraenses mais respeitados -
dizia repetidas vezes que o Município fazia justiça a um grande
pensador; que seu exemplo de bom guaraense precisava ser lembrado por todas as
gerações. A professora C. cumprimentou-me dizendo que sentia muito orgulho de
ter conhecido pessoalmente o Dr. Náufal, e que podia falar com propriedade a
seu respeito para seus alunos; o Dr. J. aproximou-se de mim para me dizer que havia
abraçado a advocacia em virtude dos ensinamentos recebidos do Dr. Náufal. Mas veio
do B. o depoimento mais emocionado que ouvi: contou-me ele que, ainda jovem, lamentando
sua condição econômica, foi alertado pelo Dr. Náufal que, em nossa cidade,
vivíamos todos modestamente, mas que a verdadeira pobreza não era a material,
mas sim a ignorância, a ausência de pensamento crítico e a omissão – e
completou sua história dizendo-me que foi do Dr. Náufal que conseguiu recursos
para que pudesse tornar-se professor universitário.
(Escola Municipal Dr. Náufal Antônio Mourani - entrada - fonte: foto escaneada de "Guará - terra do sol", livro organizado por Leila Miria de Oliveira, Ed. Noovha America, 2006)
Na última vez que estive em Guará passei em frente à escola. Não vi ali o seu nome, nem tampouco o do Dr.
Náufal. No prédio funcionava um “Centro Comunitário”. Contentei-me em ver que
a Administração Municipal, pela solidariedade, tem se preocupado com a população de
Guará!
("Centro Comunitário" - foto: arq. pessoal, 2012)
Mas, mesmo contente com o "Centro Comunitário", não consegui deixar de pensar: além de estar nas lembranças
de quem o conheceu, por onde anda o nome do Dr. Náufal? Onde está instalada a
escola? Quais cursos oferece? Quantos alunos tem? Quem são os professores?
As referências são sempre fundamentais
para a nossa formação e para os que virão depois de nós. Como enche de encanto e
orgulho, para Diamantina (MG), o nome Juscelino Kubitschek!; Getúlio Vargas para
São Borja (RS)!; Arthur Bernardes para Viçosa (MG)!; Antônio Diederichsen e Zeferino
Vaz para Ribeirão Preto (SP)!; Cândido Portinari para Brodowski (SP)!; Zequinha
de Abreu para Santa Rita do Passa Quatro (SP)!...!! E o que significa trafegar
pelas ruas e rodovias Tiradentes, Prudente de Moraes, D. Pedro I, Ayrthon Senna? Não
são nomes quaisquer! São todos referências! O que todos representam ? o que nos
inspiram ?
Pois como guaraense também sou tomado
de encanto e orgulho pelas minhas referências quando, estando lá, vejo estampado
nas paredes o nome das escolas Nehif
Antônio, Arthur Afonso Bini, Urbano Junqueira, Helena Telles Furtado! Quantos exemplos
bons tenho ao rever em placas, paredes e muros nomes como Hassan Jorge Mourani,
Dr. Francisco de Paula Leão, Américo Migliori, Dr. Jair de Paula Ribeiro, Rubens
Siqueira Martins, Massuo Nakano - nomes atribuídos a escolas, ruas, bairros, e edifícios
públicos de minha terra!
A simples lembrança dos nomes de
cidadãos-referências, em suas respectivas comunidades, aliado ao conhecimento de seus feitos e exemplos, já são
suficientes para nos orgulharmos, renovarmos nossas esperanças e energias para exercermos
a cidadania com maior entusiasmo.
Penso que todas as comunidades e cada
um de nós, individualmente, precisa de exemplos e de referências. Numa época em
que tudo é descartável, em que pouco importa o valor das coisas, em que o preço
e o imediatismo de resultados é o que conta, mais do que nunca é necessário espalharmos
e propagarmos os bons exemplos e referências que temos para podermos erguer nossas cabeças, cuidarmos
da nossa autoestima e da nossa edificação interior. Afinal, quem se lembrará
dos edificadores de nossas comunidades se os seus nomes e seus feitos ficarem escondidos
ou forem apagados da memória, dos muros e das placas, pela poeira do tempo...?
(Dr. Náufal Antônio Mourani - foto: arq. de família)