quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

UM ABRAÇO EM PELÉ

 

Fonte: https://diariohoy.net/interes-general/la-relacion-de-vinicius-de-moraes-y-pele-175116


Edson Arantes do Nascimento - Pelé
(23/10/1940 - 29/12/2022)


    O nosso querido poeta Vinícius de Moraes ocupou diversos postos na carreira diplomática brasileira. No exterior, ocupou postos em Los Angeles, Paris e Montevideo. No ano de 1966, como representante do governo brasileiro, recebeu do governo francês a condecoração do grau de "Oficial". Acontece que, no mesmo dia, e na mesma cerimônia, foi também condecorado, como "Cavaleiro", um outro brasileiro: Pelé.

    Em crônica publicada no jornal Última Hora, no mesmo ano de 1966, e posteriormente em sua coletânea de crônicas "Para uma menina com uma flor", Vinícius expressou o orgulho e a admiração que sentia pelo nosso craque de futebol.

    Condecorado como representante de governo, Vinícius orgulhava-se muito de Pelé; pois diferente dele, Pelé estava sendo distinguido pela Ordem Nacional de Mérito da França não como representante de governo, mas como "representante de si mesmo".

    A seguir, a crônica "Um abraço em Pelé" - do nosso querido Vinícius de Moraes. (disponível em https://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/prosa/um-abraco-em-pele) 

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UM ABRAÇO EM PELÉ

Eu ainda não tive o prazer de lhe ser apresentado, meu caro Pelé, mas agora, com o fato de termos sido condecorados juntos pelo governo de França - você no grau de Cavaleiro e eu no de Oficial: e mais justo me pareceria o contrário - vamos certamente nos conhecer e tornar amigos. Ninguém mais que você merece tão alta distinção, sobretudo por ter sido conferida espontaneamente - pois ninguém mais que você tem levado o nome do Brasil para fora de nossas fronteiras. Da Sibéria à Patagônia todo mundo conhece Pelé; e eu estou certo de que você entraria fácil na lista das dez personalidades mais famosas de nossos dias. 

Não posso disfarçar o orgulho que a condecoração me causa, embora seja, de natureza, avesso a honrarias; e orgulho tanto maior porque nela estamos juntos: preto e branco (as cores do meu Botafogo!) e também as cores irmãs de nossa integração racial. Sim, caro Pelé, nós representamos, em face da comenda que nos é conferida, o Brasil racialmente integrado, o Brasil sem ódio e sem complexos, o Brasil que olha para o futuro sem medo porque, apesar dos pesares, é bom de mulher, bom de música, bom de poesia, bom de pintura, bom de arquitetura e bom de bola. Particularmente por isso considero-me feliz de estar a seu lado no momento em que nos colocarem no peito a condecoração. 

Que você tenha sido distinguido pela Ordem Nacional do Mérito da França nada me parece mais natural. A França sempre deu um alto valor ao gênio, e você, meu grande Pelé, é um gênio completo, porque o seu futebol representa um reflexo imediato de sua cabeça nos seus pés. Eu não sou gênio, não. Eu tenho que pensar um bocado para que a mão transmita direito o que a cabeça lucubrou. Meus gols são mais raros que os seus. Você é com justa razão chamado o Rei. Quanto a mim, que rei sou eu? 

Mas nada disso turva a satisfação que sinto em ser o seu Coutinho nesta nova investida do Brasil na área internacional. Parabéns, meu caro Pelé. Parabéns e o melhor abraço aqui do seu irmãozinho!

terça-feira, 20 de dezembro de 2022

TABACO TEMPERADO COM CHOCOLATE

 

Baden Powell
Fonte: https://kalamu.com/neogriot/2013/06/05/video-baden-powell-brazil/

     Nunca fui fumante. Não me agrada cheiro de fumaça impregnada na roupa, nas mãos, nos cabelos, na ponta dos dedos. E mais: dentes amarelados, tosse, pigarro... Não, não dá. De interessante, no cigarro aceso, só mesmo a fumaça que dá voltas, que fica passeando pelo espaço que circunda o fumante. Se houver algum foco de luz iluminando exclusivamente o fumante, a fumaça fica mais interessante ainda: ela transmite mensagens.

     Outro dia, de longe, eu fiquei observando a fumaça produzida pelo cigarro de um fumante que estava sentado, quieto, na varanda de um bar: era azul-viva; mas ficava acinzentada, tétrica, quando, depois de ter transitado pelos pulmões do fumante, era expelida no ar pelo sopro de sua boca. Fumaça de cigarro no ar, para ser observada, requer paciência. Ela fica ali, dança devagar, vai subindo, girando...

     O Baden Powell, certa vez, em um estúdio francês, enquanto gravava "Round Midnight", prendia entre os dedos mínimo e anular, de sua mão direita, um cigarro aceso. Enquanto executava... enquanto mergulhava... enquanto voava em "Round Midnight", a fumaça produzida pela queima de seu cigarro criava em torno dele um ambiente metafísico de ligação do humano com o divino, juntando homem a entidades celestiais... E ele, de olhos fechados, comunicava com suas mãos, com seus dedos, com seu violão, toda beleza que um homem é capaz de comunicar quando transcende...

     E após ter assistido ao referido vídeo, fui tomado por uma vontade incontida... Não de fumar, mas de fazer gerar fumaça poética... para ficar só, ouvir música.... desenvolver em torno de mim toda poesia que fumaça de cigarro que sobe pode produzir.

     Fui então a uma tabacaria, escolhi um cachimbo e um pequeno pacote de tabaco inglês, com tempero de chocolate. Voltei para casa depressa, querendo me sentar sozinho em uma poltrona, ficar ouvindo as gravações do Baden Powell, e, como ele, ficar produzindo fumaça poética pela queima do tabaco ajeitado no fornilho do cachimbo que havia comprado. Cuidei do abajur ao meu lado, criei um ambiente de penumbra; escolhi os meus discos prediletos, uma bebida, e acendi o cachimbo. Senti-me, naquele momento, como uma divindade celestial: eu estava banhado em música, poesia, e fumaça de tabaco temperado com chocolate queimado. Não; eu não me encontrava no paraíso: eu era, na verdade, o próprio paraíso...

     O cachimbo, dizem os entendidos no assunto, "é uma forma de transformar um momento de ócio num ritual de meditação e prazer". E era justamente isso o que eu buscava: meditação e prazer. 

     À primeira música, uma tragada, fumo queimado no ar; à segunda música, tragadas, bebida, e fumo queimado no ar... Penumbra. À terceira música, tragadas, bebida, fumo queimado... e tosse. De súbito fui tomado por uma leveza... uma sensação estranha... uma tontura... Fiquei com a impressão de que estava girando com a fumaça... E não podendo mais me controlar, gritei:

     - Denise!!!! Tô gelado. Vou desmaiar!

     Ao ouvir-me, mais que depressa minha esposa despertou de seu sono; veio ao meu escritório, examinou o meu estado, tomou-me a mão, percebeu o suor e a temperatura fria do meu corpo. Orientando-me a baixar a cabeça, ela correu até a cozinha e retornou com um copo de leite gelado, com algumas pitadas de sal, em suas mãos:

     - Tome isso e apague essa fumaceira. Você não sabe que isso não é para tragar?

     Eu não sabia. Depois desse episódio só fui voltar ao cachimbo anos depois, durante o inverno, não para fumar, mas somente para prender entre as minhas mãos o cachimbo aceso, e mantê-las aquecidas... E ficar olhando a fumaça dançar... sentindo no ar aquele cheirinho gostoso de tabaco temperado com chocolate. 


Baden Powell - "Round about Midnight" (Thelonious Monk)
https://www.youtube.com/watch?v=mLCfIlZzEOw
    

RUBEM BRAGA, 19/12/1990: O VOO DA BORBOLETA AMARELA

 

Fonte: https://diariodopoder.com.br/brasil-e-regioes/cinebiografia-do-escritor-rubem-braga-tem-pre-estreia-em-vitoria-dia-7


Há 32 anos, com 77 de vida, falecia no Rio de Janeiro o capixaba Rubem Braga. Introspectivo, observador e meio casmurro, escreveu crônicas saborosas, marcadas por simplicidade e lirismo. Meu primeiro contato com sua obra foi ainda no curso ginasial quando, em uma aula de Português, fui chamado para ler e analisar "A outra noite" - uma das crônicas escritas pelo Rubem Braga, indicada para estudo no livro didático que o professor havia adotado. Desde então o RB e o seu jeito leve e simples de escrever passou a ser, para mim, uma grande referência. Rubem Braga faleceu em 19 de dezembro de 1990, mas muitas das crônicas que escreveu ainda estão por ser reunidas em livro. Há pouco recebi a notícia de que sua cinebiografia "O voo da borboleta amarela", de Jorge Oliveira, filmado no Espírito Santo, no Rio, e em Braga (Portugal), foi proclamado vencedor de Melhor Documentário do 13º FesTin - Festival de Cinema Itinerante da Língua Portuguesa (Lisboa, de 09 a 14/dezembro/22).

Fico por aqui. Mas não posso deixar de dizer que a ansiedade já é grande para poder assistir ao filme e rever o "velho" Braga - que em sua maturidade, no filme, é interpretado por um ator brasileiro que, em 1950, levou ao teatro a crônica "Ai de ti Copacabana" (e esse ator ainda tem muito a nos contar).


Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=B3rxLAyrbvo


quarta-feira, 5 de outubro de 2022

OS 34 ANOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988


    Resultado de uma Assembleia Nacional Constituinte, no dia cinco de outubro de 1988, há 34 anos portanto, a sétima Constituição do Brasil foi promulgada. Esta Constituição pôs fim à Constituição imediatamente anterior, a de 1967, Emendada em 1969, a qual havia sido outorgada (sem legitimidade; elaborada sem a participação dos representantes do povo; imposta).

    Nesses 34 anos de vigência, a Constituição de 1988 resistiu a tempestades e deu respaldo e orientação para decisões extremamente marcantes em nossa história. Além de dispor sobre a organização do Estado, do exercício do poder, dos direitos e garantias fundamentais, da composição e funcionamento de suas instituições, ela cuida, inclusive, a respeito dos mecanismos procedimentais para a promoção de alteração de seus próprios dispositivos. Ela é e tem sido, seguramente, a guardiã do Estado de Direito. 

    O funcionamento das instituições democráticas, sem interferências espúrias, e a preservação do pleno equilíbrio entre os três Poderes, parecem-me ser as joias mais preciosas a serem preservadas nesta Constituição.

    Em outros tempos, e por outras terras, tristes foram os descaminhos das nações conduzidas por Mussolini, Salazar, Franco, e tantos outros - além, é claro, por aqui, dos não menos tristes descaminhos maquiados de potência por vinte e um anos.

    Na vigência da Constituição ilegítima de 1967, e sob olhos amedrontados de uma nação intimidada, o atropelo na escolha de representantes, o desrespeito à diversidade e a institucionalização da tortura foram aplaudidos em cerimônias públicas (1).

    Antes, sob o manto da Constituição de 1937 também outorgada (imposta), o Estado federal tornou-se unitário; dissolveu-se: a isso, a cerimônia da queima das bandeiras, solenemente aplaudida e registrada em vídeo, evidencia.

Estado Novo: queima das bandeiras estaduais (1938)
https://www.youtube.com/watch?v=jzu_7hT45bU

    Voltando os olhos para o passado e analisando o presente, parece-me que, com o Legislativo que desenhou-se domado, o Executivo, de garras expostas, tende a promover a ingerência na organização dos Poderes, desmontando ou reformatando o Judiciário, reescrevendo a Constituição a seu bel-prazer, repetindo a queima das bandeiras estaduais, e promovendo um adestramento coletivo por todos os cantos do país.

    Neste cinco de outubro, ao celebrarmos os 34 anos da Constituição Federal de 1988, abro a janela de minha sala de trabalho com a estranha sensação de estar avistando nuvens negras no horizonte...

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(1) Cerimônia de Formatura da Guarda Rural Indígena, criada em 1969 https://www.youtube.com/watch?v=w5imv95KVOk&t=170s

sábado, 17 de setembro de 2022

"AUSCHWITZ-II-BIRKENAU": O CAMPO DE EXTERMÍNIO


Auschwitz Birkenau
Foto postada por Maxine no facebook (set/22)


    Sempre pensei que Auschwitz fosse o nome de um - apenas um - campo de concentração nazista. Mas, em breve pesquisa, fico sabendo que Auschwitz foi uma rede de campos de concentração construídos pelos nazistas nas áreas polonesas por eles anexadas.

    Auschwitz é o nome alemão para a cidade polonesa chamada Oswiecim, a cerca de 70 quilômetros a oeste de Cracóvia - também uma cidade polonesa.
  
Mapa da Polônia: localização de Auschwitz, Cracóvia e a capital Varsóvia
https://postaispelomundo.com/2015/11/20/cracovia-polonia-simplesmente-apaixonante/

    Muitos campos de concentração, extermínio e trabalhos forçados foram construídos pelos nazistas. Ao redor de Auschwitz, na Polônia, havia três grandes campos: Auschwitz I, centro administrativo e campo de concentração; Auschwitz-II-Birkenau, campo de extermínio; e Auschwitz III-Monowitz**-Buna***, campo de trabalhos forçados.

Complexo de Auschwitz e outros campos na Polônia e Alemanha
https://pt.wikipedia.org/wiki/Auschwitz

    Mas tudo isso para dizer que vi, há pouco, uma foto postada no facebook por uma amiga (Maxine) que, em visita à Polônia, foi a Auschwitz. E, em lá estando, foi visitar Auschwitz-II-Birkenau*.

    Ao olhar a foto da entrada do campo Auschwitz-II, a partir dos trilhos da estrada férrea, observo que o destino do comboio era, de fato, o extermínio: identifico em sua porta principal uma boca enorme capaz de engolir os passageiros amontoados nos vagões dos trens que por ela passavam; na torre, acima da porta, duas janelas são falsos olhos de olhar vigilante, incapazes de adormecer; as construções à direita e à esquerda da grande boca são enormes tentáculos aprisionadores que, com cruzes religiosas estruturadas em cada uma de suas janelas, decretavam que ali era a morada da morte.

Entrada de Auschwitz-II
Detalhe da foto acima, feita por Maxine

    Em Auschwitz-II-Birkenau foram exterminadas mais de um milhão e cem mil pessoas.

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*Birkenau - pequeno vilarejo próximo a Auschwitz
**Monowitz - pequeno vilarejo próximo a Auschwitz
***Buna - complexo industrial ligado a borracha, para o qual era fornecido matéria prima.

quinta-feira, 11 de agosto de 2022

MIRA IRA: UM CANTO DE AMOR PELO POVO BRASILEIRO

 

Aílton Krenak em discurso na Constituinte/87
https://revistaesquinas.casperlibero.edu.br/edicoes/63/de-qual-humanidade-voce-e/


    Aprisionado por uma tribo inimiga que praticava a antropofagia, o último dos índios Tupis, naquele que seria seu derradeiro pôr de sol, entoou um canto de morte narrando seus feitos: falou de seu pai, do amigo que caiu, das terras por onde andou, das guerras que lutou... Mas, por ter contrariado a ética do índio, "não serviu de pasto".

    Gonçalves Dias, em 1851, em I-Juca Pirama (o que deve morrer), assim grafou aquela manifestação:

"Meu canto de morte,
guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
nas selvas cresci;
guerreiros, descendo
da tribo Tupi.

Da tribo pujante,
que agora anda errante
por fado inconstante,
guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte,
sou filho do Norte,
meu canto de morte,
guerreiros, ouvi (...)"
(I Juca Pirama, Canto IV, trecho)

    Em 1985, no Festival dos Festivais da TV Globo, aquele índio ressurgiu... Majestoso, grandioso, belo, sublime e forte, foi louvado no canto de Miriam Mirah, de Lula Pereira,  do grupo Tarancón e da banda Placa Luminosa: "Mira Ira".

"Mira Ira" (Lula Barbosa e Vanderlei de Castro)
https://www.youtube.com/watch?v=ie1X7v0ie1Q


Mira num olhar
Um riacho, cacho de nuvem
No azul do céu a rolar...
Mira Ira, raça tupi,
Matas, florestas, Brasil.
Mira vento, sopra continente,
Nossa América servil,
Mira vento, sopra continente,
Nossa América servil...

Mira num olhar,
Um riacho, cacho de nuvem
No azul do céu a rolar...
Mira ouro, azul ao mar,
Fonte, forte de esperança,

Mira sol, canção, tempestade, ilusão,
Mira sol, canção, tempestade,
Ilusão...

Mira num olhar
Verso frágil tecido em fuzil,
Mescla morena,
Canela, cachaça, bela raça, Brasil.

Anana ira,
Mira ira anana tupi
Anana ira, anana ira
Mira Ira 

    Em 1987, na Assembleia Constituinte, por intermédio de Ailton Krenak, o Tupi também se manifestou:

"(...) um povo que sempre viveu à revelia de todas as riquezas (...) não pode ser identificado como um povo que é inimigo dos interesses do Brasil (...)"

Ailton Krenak, na Constituinte/87
https://www.youtube.com/watch?v=ildN6lyXDNE


    Gonçalves Dias, em I-Juca Pirama; Miriam Mirah, em "Mira Ira"; e Ailton Krenak, na Constituinte, são a expressão de um sentimento e de uma inspiração: um convite à ressurreição do povo brasileiro, que anda tão sufocado ultimamente. E, por já ser tempo desse desate de nós, "que assim seja!"

    - "Mescla morena, canela, cachaça, bela raça: Brasil!"


quarta-feira, 10 de agosto de 2022

O JOÃO GILBERTO ME APRESENTOU O BRASIL

 

https://gauchazh.clicrbs.com.br/cultura-e-lazer/musica/noticia/2019/07/um-divisor-de-aguas-criticos-definem-a-importancia-de-joao-gilberto-para-a-mpb-cjxs7ktso00b401oclf6obls5.html

    Ontem o "João Gilberto International Fan Club" postou no Facebook uma gravação feita pela Radio Nacional de España em 19/07/1985, no programa "Quando os elefantes sonham com a música", de Carlos Galilea.

    Ouvi atento à gravação - que não conhecia. Ao ouvi-la reencontrei um rapaz... Um rapaz que gosta de ouvir as interpretações do João Gilberto; que gosta de encontrar por intermédio de sua voz e de seu violão uma paz azul, infinita, baiana, utopicamente brasileira... uma paz de quintais, de plantas, de árvores, de praias, gente alegre e riachos, de horizontes e distâncias...


João Gilberto - "Canta Brasil" (David Nasser/Alcyr Pires)
https://www.youtube.com/watch?v=h1wEH6FXi4c


    O rapaz encontrou-se com o João Gilberto em um almoço, sob a escadaria de uma casa em Los Angeles. Naquela tarde, oferecendo ao rapaz uma feijoada, um casal de pesquisadores procurava mostrar o seu encantamento pelo Brasil.

    Logo na chegada o rapaz ouviu, vindo de uma vitrola ao lado das escadas, uma voz delicada, mansa, pedindo que o Brasil cantasse... "(...) no céu, no mar, na terra, canta Brasil (...)". O rapaz não cantou. Ao contrário, emocionado, ficou em silêncio... ouvindo.... só ouvindo. O casal sorriu. Ouviram quietos, calados, os três... parados, emudecidos, como que a decifrar o Brasil por imersão em matas imaginárias, a observar comunidades indígenas, passarinhos, riachos e praias...

    Nem o casal e nem o rapaz foram mais os mesmos... E nem o Brasil do rapaz. Na proposta de inocência e doçura originadas naquela voz e naqueles acordes de violão, o berço da delicadeza perdida abraçou o rapaz. De Los Angeles, maravilhado, o rapaz compreendeu as possibilidades de seu país... para querê-Lo bem, para orgulhar-se dele... muito embora corresse o ano de 1975... e sob o domínio do terror, o Brasil se encolhia em um estado acinzentado, sufocante.... de duríssima exceção... de cuja ideia ainda procuramos nos livrar.


CANTA BRASIL

As selvas te deram nas noites teus ritmos bárbaros
E os negros trouxeram de longe reservas de pranto
Os brancos falaram de amor em suas canções
E dessa mistura de vozes nasceu o teu canto
Brasil, minha voz enternecida
Já adorou os seus brasões
Na expressão mais comovida
Das mais ardentes canções
Também na beleza desse céu
Onde o azul é mais azul
Na aquarela do Brasil
Eu cantei de norte a sul
Mas agora o teu cantar
Meu Brasil, quero escutar
Nas preces da sertaneja
Nas ondas do rio-mar
Oh, esse rio turbilhão
Entre selvas de rojão
Continente a caminhar

No céu, no mar, na terra
Canta Brasil
No céu, no mar, na terra
Canta Brasil
No céu, no mar, na terra
Canta Brasil
No céu, no mar, na terra
Canta Brasil.

 

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Postagem João Gilberto International Fan Club  https://www.bossanovaclube.com/post/jo%C3%A3o-gilberto-en-madrid-19-07-1985-hipnotismo-colectivo?fbclid=IwAR1TfA5i2r6LHRUIfX1bad8ge9vDA_0Rwx2Ivj39BXyIBy3O-wA8s0sxuEw

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

LOUVAÇÃO


Capa do álbum de estreia de Gilberto Gil: "Louvação" (1967)

É certo que uma imagem diz mais que mil palavras; é certo que uma palavra escrita inspira uma infinidade de sentimentos... Mas é a palavra pronunciada, ouvida, carregada dos sinais daquele que a pronuncia, que tem a capacidade de melhor traduzir uma verdade.

Na impossibilidade de ser pronunciada, a palavra livremente escrita traz o pensamento do seu autor desprovido de maquiagem. Com palavras escritas pintamos o que os nossos olhos veem, e oferecemos aos nossos eventuais leitores as verdades que enxergamos, e em relação às quais não somos indiferentes.

Assim, louvemos tudo aquilo que vem com seu próprio contorno, com clareza, aberto, e transbordando de significados.

- "Vou fazendo a louvação... e falo de peito lavado!"


CLIQUE NA SETA PARA OUVIR

Gilberto Gil - "Louvação"- do álbum de estreia do Gilberto Gil - 1967

https://www.youtube.com/watch?v=mH4regr0Etc


LOUVAÇÃO

(Gilberto Gil/Torquato Neto)

Vou fazer a louvação - louvação, louvação

Do que deve ser louvado - ser louvado, ser louvado

Meu povo, preste atenção - atenção, atenção

Repare se estou errado

Louvando o que bem merece

Deixo o que é ruim de lado

 

E louvo, pra começar

Da vida o que é bem maior

Louvo a esperança da gente

Na vida, pra ser melhor

Quem espera sempre alcança

Três vezes salve a esperança!

 

Louvo quem espera sabendo

Que pra melhor esperar

Procede bem quem não pára

De sempre mais trabalhar

Que só espera sentado

Quem se acha conformado

 

Vou fazendo a louvação - louvação, louvação

Do que deve ser louvado - ser louvado, ser louvado

Quem 'tiver me escutando - atenção, atenção

Que me escute com cuidado

Louvando o que bem merece

Deixo o que é ruim de lado

 

Louvo agora e louvo sempre

O que grande sempre é

Louvo a força do homem

E a beleza da mulher

Louvo a paz pra haver na terra

Louvo o amor que espanta a guerra

 

Louvo a amizade do amigo

Que comigo há de morrer

Louvo a vida merecida

De quem morre pra viver

Louvo a luta repetida

Da vida pra não morrer

 

Vou fazendo a louvação - louvação, louvação

Do que deve ser louvado - ser louvado, ser louvado

De todos peço atenção - atenção, atenção

Falo de peito lavado

Louvando o que bem merece

Deixo o que é ruim de lado

 

Louvo a casa onde se mora

De junto da companheira

Louvo o jardim que se planta

Pra ver crescer a roseira

Louvo a canção que se canta

Pra chamar a primavera

 

Louvo quem canta e não canta

Porque não sabe cantar

Mas que cantará na certa

Quando enfim se apresentar

O dia certo e preciso

De toda a gente cantar

 

E assim fiz a louvação - louvação, louvação

Do que vi pra ser louvado - ser louvado, ser louvado

Se me ouviram com atenção - atenção, atenção

Saberão se estive errado

Louvando o que bem merece

Deixando o ruim de lado


domingo, 19 de junho de 2022

O DIA DO CINEMA BRASILEIRO


https://brasilescola.uol.com.br/datas-comemorativas/dia-do-cinema-brasileiro.htm

    O que faria uma pessoa inteligente que estivesse chegando no Brasil em 1898, dois anos do final do século XIX, com um cinematógrafo em mãos? E se essa pessoa, com esse cinematógrafo em mãos, estivesse adentrando a Baia de Guanabara a bordo de um navio? E se fosse um dia ensolarado? Diante de tanto estímulo visual, para onde essa pessoa direcionaria seu olhar? A Oeste veria a cidade do Rio de Janeiro; a Leste, Niterói; ao Norte, a Ilha do Governador... E ali, diante de seus olhos, o Pão de Açúcar e o Morro da Urca. Para não se esquecer de nada...


https://brasilianafotografica.bn.gov.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/4763

    Então!

    Foi isso mesmo que essa pessoa, chamada Afonso Segreto, fez: a partir do navio no qual viajava, vindo da Europa, registrou em imagens que se moviam a entrada na Baia de Guanabara. Era o dia 19 de junho de 1898. Apesar de algumas controvérsias, as imagens que captou naquele dia são consideradas as primeiras imagens cinematográficas tomadas no Brasil.

    A partir daí o cinema brasileiro foi montado e projetado sob ideias e propósitos diversos: do cinema mudo passamos aos "posados" e "cantados", adaptamos textos literários para as telas; por diversos cantos do Brasil pensamos e trabalhamos o cinema (ciclos regionais); projetamos nas telas as chanchadas; expusemos nossa realidade no "cinema novo"; zombamos de tudo e de todos no "cinema marginal"; apelamos para a pornochanchada; e depois de um período de grandes dificuldades, voltamos a insistir com o cinema nacional para, no presente, nos encontrarmos jogados no fundo de um abismo.

    Mas... resistimos! Há mentes brilhantes e cineastas geniais no Brasil. Pela telona, e com o estímulo do Estado, o nosso povo, as nossas paisagens e a nossa cultura podem correr mundo. Somos o país que queremos fazer - ou que pelo menos tentamos.

    Nesse 19 de junho, as nossas homenagens ao cinema brasileiro.


quinta-feira, 9 de junho de 2022

ARTUR DA TÁVOLA


Artur da Távola
https://www.facebook.com/205471092873653/photos/a.205471339540295/2896449627109106/

    Do final do ano de 1999 até o falecimento do apresentador, em 2008, eu costumava assistir, semanalmente, a um programa na TV Senado chamado "Quem tem medo da música clássica?"

    O programa, que ia ao ar tarde da noite, era apresentado pelo então senador fluminense, poeta, professor e advogado, Artur da Távola - pseudônimo de Paulo Alberto Moretzsohn Monteiro de Barros (1936-2008). Foi nesse programa que conheci um pouco da história de muitos dos grandes compositores e suas obras, assisti a alguns concertos gravados por orquestras renomadas, e conheci muitos instrumentos musicais.

    Há anos a TV Senado montou e comercializou um kit contendo DVDs com as gravações de alguns desses programas. Na época eu quis adquirir esse kit para poder rever, sempre que quisesse, os programas gravados que tanto me agradavam, mas nunca consegui encontrá-lo.

    Lembrei-me desse programa agora porque estava lendo "Vida de Cinema", livro do cineasta Cacá Diegues (Ed. Objetiva, 2014), no qual o autor fala de sua vida e de seu trabalho, e comenta sobre as pessoas que o influenciaram e que foram importantes em sua trajetória: o Artur da Távola foi um deles. Posso inclusive dizer que, sem que o tivesse sabido, o Artur da Távola, por intermédio desse programa da TV Senado (e, posteriormente, pelos seus livros), assim como tanta gente, também foi importante para a minha formação.

    Bom... tudo isso para contar que quero deixar guardado aqui pelo menos um dos programas que assisti, como se estivesse reservando para mim o privilégio de poder revê-lo sempre que o desejar.

    Espero que todo aquele que tiver acesso a esta pequena publicação também possa se sentir inspirado a viajar pela música clássica, desenvolvendo, inclusive, um gosto significativo por ela. Recomendo que o vídeo seja assistido à luz de apenas um pequeno abajur, em silêncio, na companhia de ninguém mais a não ser de si mesmo... Se for madrugada, melhor ainda. Afinal, nas palavras do próprio Artur da Távola, "música é vida interior, e quem tem vida interior, jamais padece de solidão".

    - Voilà! 

https://www.youtube.com/watch?v=TIfs1TXcQ6w


sábado, 4 de junho de 2022

"O FADO", DE JOSÉ MALHOA E DO POVO PORTUGUÊS


"O Fado" (1910, José Malhoa) - Foto: arq. pessoal

     Em 1910, para retratar a boemia e a marginalidade portuguesas da época, José Malhoa* pintou um quadro ao qual deu o nome de "O Fado"**. Nesse seu trabalho, o artista mostra o ambiente interno de uma tasca portuguesa. Nela, um fadista com sua guitarra, em um banco de madeira, canta para uma mulher que está sentada em uma cadeira, com um cigarro entre os dedos de sua mão direita e com a perna esquerda pousada sobre o banco no qual o fadista está sentado. Com o cotovelo do braço esquerdo sobre a mesa a mulher sustenta sua cabeça com a palma da mão, e tem a face voltada para o fadista. Com ele, ela parece estabelecer uma comunicação de perfeita sintonia e cumplicidade: cantando, ele expõe o seu fado; ela, inspirada pelo canto que ouve, parece que se derrama em pensamentos melancólicos - como melancólicas são as histórias narradas nas letras dos fados.     

CLIQUE NA SETA
Amália Rodrigues - "Fado Malhoa"
https://www.youtube.com/watch?v=toe-KBYP7N4



     Amâncio, um famoso fadista*** na época, e uma mulher de má reputação que ficou conhecida como Adelaide da Facada (porque tinha no rosto uma cicatriz), foram modelos e inspiração para o artista.

     Por intermédio da criatividade portuguesa, a obra artística até ganhou vida. Em uma curta fantasia****, a fadista Amália Rodrigues, observando o quadro, "entra" nele, como se ela mesma fosse a Adelaide da Facada, levanta-se da cadeira, e canta um fado: o "Fado Malhoa". 



Fado Malhoa
(José Galhardo/Frederico Valério)

Alguém que Deus já lá tem, pintor consagrado
Que foi bem grande e nos doi já ser do passado
Pintou numa tela com arte e com vida
A trova mais bela da terra mais querida

Subiu a um quarto que viu à luz do petróleo
E fez o mais português dos quadros a óleo
Um Zé de Samarra, com a amante a seu lado
Com os dedos agarra, percorre a guitarra
E ali vê-se o fado

Faz rir a ideia de ouvir com os olhos, senhores
Fará, mas não p'ra quem já o viu mas em cores
Há vozes da Alfama naquela pintura
E a banza derrama canções de amargura

Dali vos digo que ouvi a voz que se esmera
Boçal dum Faia banal, cantando a Severa
Aquilo é bairrista, aquilo é Lisboa
Boémia e fadista aquilo é de artista
Aquilo é Malhoa
Aquilo é bairrista, aquilo é Lisboa
Boémia e fadista aquilo é de artista
E aquilo é Malhoa

     Sempre gostei desse quadro, e muitas vezes me imaginei conhecendo-o de perto. Ele tornou-se um clássico: tanto que é reproduzido em muitos trabalhos em azulejos trabalhados em azul, comuns no país. 

"O Fado" - trabalho em azulejo - Foto: arq. pessoal

     Os azulejos pintados são uma marca da cultura portuguesa. Tanto que há, no país, muitos edifícios públicos e igrejas (inclusive um museu - o Museu do Azulejo, em Lisboa) decorados com trabalhos feitos em azulejo, que contam a história de seu povo, de suas lutas e de seus personagens.

     No final do ano passado, em viagem a Portugal, eu e minha mulher fomos caminhar pelo bairro de Alfama, em Lisboa. Em uma de suas ruelas encontramos uma tasca deliciosamente aconchegante: as mesinhas decoradas com toalhas vermelhas sobre a mesa, postas para o jantar, e a figura do quadro de José Malhoa em destaque, ao fundo, pintada em cerâmica. Senti como se aquele aparente aconchego fosse o convite perfeito que precisávamos para passar a noite ali. 

"A Tasca" - Foto: arq. pessoal

     E assim fizemos. Encantados com o ambiente, ficamos ali para o jantar e para ouvir um fadista cantar, mergulhados no clima de nostalgia inspirado pelo local e pela música.

     Ao final da noite fomos agradecer ao gerente da tasca pelo jantar. Comentando com ele sobre "O Fado" em azulejo, na parede da tasca, ouvimos dele a informação de que o quadro original de José Malhoa ficava em exposição permanente no Museu do Fado, a duzentos metros dali.

"O Museu do Fado" - Foto: arq. pessoal 

     Na tarde do dia seguinte voltamos a Alfama. Além de gostar de museus, eu tinha agora um motivo a mais para conhecer o Museu do Fado. Descemos apressadamente a ruela da zona histórica de Lisboa, onde havíamos estado na noite anterior, e seguimos em frente até chegar ao Largo do Chafariz - endereço do Museu do Fado. Foi ali então que, por um bom tempo, deixei passear os meus olhos no original daquele quadro de que tanto gosto, e que simboliza muito da cultura do povo português: "O Fado", de José Malhoa. Como recordação, além de muitas fotos, trouxe dez cartões-postais com a imagem do quadro para a minha coleção.
_____________________________________ 
*José Vital Branco Malhoa (1855-1933) foi um pintor, desenhista e professor português.
**"O Fado" - óleo sobre tela, 150 cm de altura e 183 cm de largura
***na época, início do século XX, "fadista" era sinônimo de "marginal"
****Este pequeno filme, de 1947, pode ser visto em: https://www.youtube.com/watch?v=ZNCfktEU5L8&list=RDZNCfktEU5L8&start_radio=1&t=6


quarta-feira, 1 de junho de 2022

UMA PALAVRA, TANTAS PALAVRAS


Chico Buarque - "Tantas palavras" (Chico Buarque/Dominguinhos)
https://www.youtube.com/watch?v=kHtDrbxtBC0


Uma palavra
tantas palavras,
as minhas palavras,
todas as palavras.

Uma palavra prima,
só, solta, direta...
uma ideia!

Uma palavra firme,
forte, decisiva, conclusiva,
incisiva.

Uma palavra concisa,
indecisa,
imprecisa.

De uma palavra, um sentimento.
Uma palavra, uma leitura.

Da palavra, um grito;
da palavra, um sussurro;
da palavra, um apelo;
da palavra, uma lamento;
da palavra, uma poesia.

Tantas palavras,
tantas pontes possíveis,
tantas interpretações:
quantas distorções!

Nas minhas palavras,
as minhas mensagens,
o meu desejo de ser ouvido.

Na palavra que pronuncio,
o contorno do que vejo,
a tradução do que me bole,
a expressão do que busco.

Em todas as palavras a ligação,
do homem com o homem,
do homem com o universo.

Na sua leitura, o resultado:
palavras duras, palavras certas,
palavras soltas, palavras desconexas...
palavras que amenizam,
palavras que agridem,
palavras que constroem,
palavras que destroem...

É preciso falar com clareza.
Mas, especialmente,
é preciso ouvir com atenção.

Em cada palavra uma súplica:
uma busca por aproximação,
ou uma arma que espanta o irmão.

Uma palavra, um sentido:
matéria-prima que constrói uma ponte de afeto,
ou que destrói a possibilidade da sua existência...

... ao sabor de quem a ouve.


quinta-feira, 5 de maio de 2022

O BRASIL EM LIVROS

 

https://www1.folha.uol.com.br/independencia-200/2021/05/conheca-200-importantes-livros-para-entender-o-brasil.shtml


    O jornal FOLHA DE SÃO PAULO de hoje, 05/maio, trouxe um CADERNO ESPECIAL especialíssimo. Nele, a relação de 200 livros que, como um quebra-cabeças, podem nos ajudar a conhecer um pouco do Brasil. 169 intelectuais que compuseram uma Comissão formada pela FOLHA, Projeto República (UFMG) e Associação Portugal Brasil 200 anos, fizeram suas indicações.

    Assinante do jornal impresso que fui, por muitos anos (hoje assinante somente do jornal eletrônico), caminhei até à banca de jornais e revistas, deliciosamente motivado, para poder ter o CADERNO ESPECIAL impresso.

    Eis os primeiros cinco livros indicados (dos duzentos):

1- Quarto de despejo - de Carolina Maria de Jesus;2- Grande Sertão: Veredas - de Guimarães Rosa;3- A queda do céu - de Davi Kopenawa e Bruce Albert;4- Raizes do Brasil - Sérgio Buarque de Hollanda;5- Casa Grande & Senzala - Gilberto Freyre...... e por aí vai!

    Que tal?

    Todos os nossos aplausos à FOLHA pela publicação deste Caderno.    Desde o Brasil pintado e bordado pelos artistas, viajantes e cientistas que aqui chegavam nas expedições, têm sido buscado  um traço para o perfil do país e de seus habitantes. Muitos têm tentado explicá-lo. Gosto de tentar entendê-lo. Contudo, creio que esses perfis sofrem  transformações incessantes, que qualquer explicação existente passa a ser referente ao país e ao brasileiro de um tempo e de um lugar específico. Há linhas gerais, mas a diversidade aponta para diversos brasis em um Brasil habitado por brasileiros com perfis  ainda em construção. D. Pedro II tentou dar ao país uma identidade, por trabalho desenvolvido pelo IHGB: foi até criado um concurso para se encontrar uma linha de tentativa de explicação do Brasil.

    Dentre tantos, gosto de “O Povo Brasileiro”, do Darcy Ribeiro, que dizia o seguinte: “a coisa mais importante para os brasileiros é inventar o Brasil que nós queremos”.

    Assim, vamos lendo, pensando, debatendo...  montando nossas peças em quebra-cabeças para, quem sabe daqui a muitos e muitos anos, podermos juntar  tudo isso e ver, não no que vai dar, mas como temos caminhado.

Querelas do Brasil (Maurício Tapajós/ Aldir Blanc - Grupo de MPB da UFPR
https://www.youtube.com/watch?v=SfXVw6AAU4A


QUERELAS DO BRASIL


O Brazil não conhece o Brasil
O Brasil nunca foi ao Brazil
Tapir, jabuti
Liana, alamanda, ali, alaúde
Piau, ururau, aki, ataúde
Piá-carioca, porecramecrã
Jobim akarore, Jobim-açu
Uô, uô, uô

Pererê, camará, tororó, olerê
Piriri, ratatá, karatê, olará
Pererê, camará, tororó, olerê
Piriri, ratatá, karatê, olará

O Brazil não merece o Brasil
O Brazil tá matando o Brasil

Jereba, saci
Caandrades, cunhãs, ariranha, aranha
Sertões, Guimarães, bachianas, águas
Imarionaíma, ariraribóia
Na aura das mãos de Jobim-açu
Uô, uô, uô

Jererê, sarará, cururu, olerê
Blá-blá-blá, bafafá, sururu, olará
Jererê, sarará, cururu, olerê
Blá-blá-blá, bafafá, sururu, olará

Do Brasil, SOS ao Brasil
Do Brasil, SOS ao Brasil
Do Brasil, SOS ao Brasil

Tinhorão, urutu, sucuri
Ujobim, sabiá, bem-te-vi

Cabuçu, Cordovil, Cachambi, olerê
Madureira, Olaria e Bangu, olará
Cascadura, Água Santa, Acari, olerê
Ipanema e Nova Iguaçu, olará

Do Brasil, SOS ao Brasil
Do Brasil, SOS ao Brasil