quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A VIDA, NAS NUVENS DE OSCAR NIEMEYER



                                   ("Oscar Niemeyer" - fonte: news.yahoo.com)


     Cheguei no escritório hoje de manhã e fui direto à estante procurar uma coletânea de crônicas do Oscar Niemeyer (1). Ainda trazia na cabeça a mensagem enviada de Brasília pelo meu filho – Gabriel - ontem à noite, perguntando-me se eu ficara sabendo da morte do Oscar:

     - Pai, você viu que o Niemeyer morreu? – perguntou-me ele, via “torpedo” no celular.

     O Niemeyer - esclareço - sempre foi um nome que me acompanhou a vida toda. Não que eu conhecesse bem e estudasse seu trabalho de traçar linhas que se harmonizam com a natureza. Mas ele sempre foi para mim um personagem quase que fictício, uma obra da imaginação, dos livros, das revistas, de referências enfim. Sempre que leio ou ouço seu nome o que me vem são seus traços leves, as ideias de humanismo, leveza e modernidade. 

     Fui conhecer melhor seu trabalho há poucos anos quando estive em Brasília pela primeira vez - e me encantei pela cidade. Foi um encantamento comum - meu e do meu filho, que descobriu a cidade comigo. 

     Depois, em viagem pela Inglaterra no ano passado, ao apresentar o Brasil para rotarianos de lá, falava do Niemeyer com emoção e orgulho sempre que em alguma reunião sua figura e suas obras eram projetadas em slide na tela:

     - This man is over 100 years old and is still teaching us how to live... (Esse homem tem mais de 100 anos e ainda está nos ensinando a viver) – eu comentava.

     Pois a primeira crônica que li hoje, ao abrir a coletânea, falava de viagens e de nuvens (2). Nela o Niemeyer descrevia suas viagens de carro a Brasília. Ele comentava que sua distração era ficar olhando as nuvens; que as nuvens no espaço iam formando figuras, catedrais, guerreiros, monstros, mulheres; mas que as figuras iam se deformando, desfazendo, fustigadas pela fúria dos ventos. E, no final, ele comparava nossa existência com as nuvens que eram formadas:

     “(...) senti como aquela metamorfose perversa se assemelhava ao nosso próprio destino, obrigados a nascer, crescer, lutar, morrer e desaparecer, para sempre (...).” 

     Ao falarmos de Niemeyer, inevitavelmente o associamos à Arquitetura. Fica na gente a ideia de um homem fazendo traços, com o pensamento voltado exclusivamente para algum projeto (arquitetônico). E ele mesmo, em “Arquitetura em Debate” da mesma coletânea de crônicas, comenta sua atividade profissional:

     “Na verdade, é debruçado na prancheta que passo os dias, trabalhando das 9:00 até à hora do jantar(...).”

     E no mesmo texto, concluindo seu raciocínio, continua:

     “(...) mas sempre reservando um tempo para ficar sozinho a cuidar dos meus projetos (...) ou a pensar na vida, no ser humano tão frágil e desprotegido, neste mundo estranho e injusto que devemos modificar. Tudo isso, mais importante do que a arquitetura.” 

     Pensando nessas coisas, e já me ajeitando para as lidas do meu trabalho, reabri a caixa de mensagens do meu celular para reler minha reposta ao “torpedo” do meu filho:

          - Vi sim, filho [a notícia da morte do Niemeyer]. Sua irmã me contou. Ele sempre foi uma referência para o Brasil no exterior. E continuará sendo. Tudo tem seu tempo... Até o nosso tempo de existência. Fica o que fizemos. Boa noite. Beijão. Daddy. 

("Fica o que fizemos" - Congresso Nacional, Brasília/DF: projeto de O. Niemeyer - arq. pessoal)



(1) Nyemeyer, Oscar. Crônicas. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Revan, 2008 
(2) "Nuvens" 

RP, 06dez12

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