terça-feira, 12 de agosto de 2014

O MENINO DE ENGENHO QUE NÃO FUI



(CLIQUE PARA OUVIR ENQUANTO LÊ)
(Fábio Zanon - "Mazurka choro", de Heitor Villa-Lobos)

     Em uma manhã ensolarada de sábado, eu e Denise pegamos a estrada para o "Museu Nacional do Açúcar e do Álcool"... aliás, para o "Engenho Central"; ou seja, para a "Usina"...

     - "Epa, que confusão! Afinal, para onde queríamos ir?" 

     Caro (e raro) leitor e amigo. Calma. Por ter me dado a honra de ler e tentar entender, pacientemente, as coisas um tanto confusas e desconexas que venho escrevendo aqui, sei que é muito tolerante em relação a minha pessoa. Agradeço. Por isso acho melhor recomeçar essa história de outra forma, desde o seu princípio, lá do meu escritório, enquanto olhava para o nada. Explico melhor. 

     Dispostos um ao lado do outro, em minha estante estão cinco livros escritos pelo José Lins do Rego: “Menino de Engenho” (1932), “Doidinho” (1933), “Bangüe” (1934), “Usina” (1936), e “Fogo Morto” (1943). Esses livros compõem, na obra do Zé Lins, um período chamado de “Ciclo da cana-de-açúcar”. Sem saber porque, eu os releio com frequência. Gosto de ficar olhando para eles e imaginando um menino, descalço e sem camisa, brincando em um engenho que não conheço e onde não fui. Esses livros e essas ideias me colocam em um período que não vivi, e em uma realidade muito diferente da minha: o mundo e o tempo do engenho.

     Nesses cinco livros o autor começa descrevendo, em “Menino de Engenho”, a vida em um engenho de açúcar, e termina mostrando, em “Fogo Morto”, a decadência e substituição, como modo de produção, do engenho pela usina.

     Tomado por ideias de engenho, usina e transformações sociais, fiquei sabendo da inauguração, entre os municípios de Pontal e Sertãozinho-SP, em dezembro do ano passado, da primeira etapa do projeto do "Museu Nacional do Açúcar e do Álcool".

     E foi aí que eu, como que a recuperar um tempo passado em um local onde não vivi (mas com a alegria de um menino de engenho que só conheci em livros),  e acompanhado da Denise em uma bela manhã de sábado, peguei o caminho para o "Museu".

     Depois de trafegarmos em asfalto, entramos em uma estrada de terra que passava por canaviais e pela fazenda Vassoural. Chegamos então ao antigo Engenho Central, onde está instalado o museu. 

(Vista lateral do engenho-usina-museu - foto: eu e Denise - arq. pessoal - jun/14)
     
     Recebidos e guiados por monitores, revimos e resgatamos, nas histórias do engenho, a história da exploração da cana-de-açúcar no desenvolvimento da economia do nosso país.

(Vista lateral - galpão de descarregamento e pesagem da cana-de-açúcar - foto: arq. pessoal)
     
     Fizemos a trajetória da cana dentro do engenho, desde a sua chegada e passagem pela balança para descarregamento, com posterior alimentação das esteiras, por onde segue para a moagem, e em seguida para o tratamento do caldo, fabricação e ensacamento do açúcar.

(Vista interna - processo de produção - foto: arq. pessoal)
(Vista interna - 1 - processo de produção - foto: arq. pessoal)

     As instalações do engenho-museu são grandiosas. Todo ele foi equipado com maquinaria escocesa do final dos anos 1880, com início de funcionamento em 1906. A produção de açúcar durou até 1964, quando, então, foi substituída pela de aguardente - fabricado até 1974.

     Dos equipamentos parados e expostos, foi doído ver o relógio da torre. De lá retirado, posto sobre o chão, expõe seu cansaço em marcar o tempo, em reter e controlar todas as horas que ditavam o ritmo da produção... ele, que por muitos anos controlou a dinâmica de tudo, agora vencido e sem uso... 

(Relógio da torre mais alta - foto: arq. pessoal)

     Na visão geral que tive ao chegar no engenho-usina-museu, o que se destacou, com imponência, foi o padrão britânico da arquitetura daquele período em suas edificações - com galpões amplos e tijolos aparentes.

(Entrada na área de produção - prédio em padrão britânico de arquitetura - foto: eu e Denise - arq. pessoal)
     
     Gostei da visita. Gostei muito. Penso até que o engenho Santa Rosa e o Carlos de Melo, da obra do Zé Lins, para mim já não serão mais os mesmos - eles passaram a existir, para mim, com maior intensidade. Creio mesmo que gostei de tudo o que vi por eu ter passado a vida rodeado de engenhos inexistentes, nos quais, sem saber, fui um menino.  


(Vista, com chaminé ao fundo - foto: eu - arq. pessoal)

     No final da visita, tomado por uma incontida alegria infantil, encontrei uma goiabeira próxima à chaminé, no fundo do engenho, de onde colhi e devorei "no ato" uma goiaba branca, temperada com o gosto do açúcar que escorreu para as terras que nutriram suas raízes.

(Uma goiabeira próxima à chaminé - foto: arq. pessoal)

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Obs.: aos que tiverem interesse, o site do "Museu" é www.engenhocentral.com.br
Também  http://www.engenhocentral.com.br/apresentacao/apresentacaoMuseucana.pdf

   

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