terça-feira, 17 de março de 2015

ELIS, 70


(CLIQUE NA SETA PARA OUVIR)

(Elis Regina - "La nuit de mon amour", de Dolores Duran, versão em francês Pierre Barouh)


     Elis Regina, se estivesse viva, estaria completando hoje 70 anos de idade. Para lembrar a data, o jornal "Folha de São Paulo" trouxe a notícia do lançamento de "Elis Regina - Nada será como Antes" - uma biografia escrita pelo jornalista Júlio Maria (Ed. Master Books). 

("Nada será como antes" - capa do livro. Fonte: http://glamurama.uol.com.br/a-maior-cantora-do-brasil-conclui-biografo-de-elis-regina/)

     Da Elis, esta não será a primeira biografia. Em 1985, poucos anos após sua morte (1982), foi publicado "Furacão Elis" - biografia de autoria da jornalista e escritora Regina Echeverria (Ed. Leya). Li essa biografia e gostei muito.


("Furacão Elis" - capa do livro. fonte: http://www.reginaecheverria.com.br/biografias_14.html)

     E hoje de manhã vindo para o trabalho, pensando na notícia da jornal, automaticamente peguei para ouvir no carro uma coletânea da Elis. Dentre tantas coisas boas que ela gravou, sem pensar duas vezes escolhi a versão em francês cantada pela Elis que Pierre Barouh fez para "A noite do meu bem".

     Claro que poderia ter escolhido qualquer uma das muitas gravações maravilhosas que a Elis fez: "Dois prá lá, dois prá cá", "Gracias a la vida", "O bêbado e o equilibrista", "Casa no campo", "Atrás da porta", ou qualquer outra...

     Mas certamente porque, em se tratando de música tenho minhas predileções pelo cantar baixo da bossa-nova, preferi "A noite do meu bem" - e em francês.  

("Elis em Paris" - capa do "compacto" -  fonte: http://www.soboceudeparis.com/2012/01/elis-em-paris.html#.VQiWnY5jk7k)

     Ouvindo essa música e pensando na história de vida da Elis, lembrei-me também da Dolores Duran que a compôs e gravou em 1959. Pois ambas nos deixaram muito cedo: a Elis aos 36 anos de idade; e a Dolores aos 29. 

     E com essa oração, rezada mentalmente várias vezes no dia, presto minha homenagem à Elis (e à Dolores também).



LA NUIT DE MON AMOUR

Ce soir je veux trouver la rose la plus belle
Et la première étoile que m’appelle
Pour mieux fêter la muit de mon amour

Ce soir, je veux la paix dês enfants qui s’endorment
Je veux l’écho d’une vie qui se forme
Por mieux fêter la muit de mon amour.

Je veux toute la joie d’un voilier que s’élance
Et l’abandon d’une mais que s’avance
Vers la chaleur d’une étreinte d’amour.

Ce soir, jê voudrais toute la beauté du monde
Pour que cette nuit soit la plus profonde
Puisqu’elle sera la nuit de mon amour

Pourtant ces joies soudais me semblent incertaines
Je ne peux croire qu’elle se revele
Cette esperance qui me vient de toi.

Ah, comme cet amour me tarde à venir
Tant que je ne sais comment retenir
Cette tendresse que jê veux offrir.

A NOITE DO MEU BEM

Hoje eu quero a rosa mais linda que houver
E a primeira estrela que vier
Para enfeitar a noite do meu bem.

Hoje eu quero paz de criança dormindo
E o abandono de flores se abrindo
Para enfeitar a noite do meu bem.

Quero a alegria de um barco voltando
Quero a ternura de mãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem.

Ah, eu quero o amor, o amor mais profundo
E quero toda beleza do mundo
Para enfeitar a noite do meu bem.

Ah como esse bem demorou a chegar
Eu já nem sei se terei no olhar
Toda pureza que quero lhe dar.




quarta-feira, 4 de março de 2015

SOMETHING (ou "Uma noitada no 'Bar do Ademar')


http://www.alvoradaam.com.br/

     É terça-feira, oito e meia da noite, e estou em casa. Ligo o rádio portátil. Giro o dial de um lado para o outro, várias vezes, em diversas faixas de onda, mas não encontro nada aproveitável. Tudo descartável. Quanto maltrato à nossa já judiada inteligência!

     Penso em alguma coisa que me daria prazer em ouvir: uma música com letra inteligente, um programa de violão clássico, uma entrevista com algum pensador, um comentário a respeito de algum livro... alguma coisa... 

     - Ahhhh, isso mesmo: SOMETHING (alguma coisa)!
 
     Ai quem me dera poder ouvir no rádio essa música gravada pelos Beatles, uma, duas, três vezes... bem alto! E que após ouvi-la o locutor, com voz embargada de emoção, dissesse simplesmente "Que maravilha! vamos ouvi-la de novo!

     Lembro-me que, em relação à gravação original de "Something" pelos Beatles, o George e o Eric Clapton, ao vivo no Japão, fizeram a inserção de uma segunda parte no solo... 

(CLIQUE PARA OUVIR)

     Decido. O melhor a fazer é me deixar levar pelas sete cidades do Japão onde o disco foi gravado.

     Mas só as sete cidades do Japão não me bastam. Abri as portas de casa, entrei no carro, ganhei as ruas. Fui por instinto ao "Bar do Ademar", onde há duas pequenas mesas de madeira na calçada - e está sempre vazio. Estacionei bem em frente a uma delas. No balcão onde dois senhores conversavam peguei uma cerveja com um pacotinho de amendoim torrado e uma salsicha em conserva picada no prato. Sentei-me em um banquinho de uma das mesas externas, encostado na parede. Tendo o céu como limite fiquei olhando a noite, a lua, as estrelas. Liguei o aparelho de som do carro. Deixei suas portas abertas. Coloquei para tocar "Something". Bem alto. Olhei para o balcão e vi o Ademar esboçar um sorriso e erguer o polegar da mão direita. Ouvi a mesma música mais uma vez e, em seguida me aquietei e deixei o CD inteiro rolar. E continuei olhando o invisível. Só então me dei conta de que, em uma noite de terça-feira, sem qualquer perspectiva, estava fazendo um passeio por sete cidades do Japão, Londres, Paris, San Diego, Salvador, Uberlândia, São Paulo, Ribeirão, e, inevitavelmente, pelas antigas ruas de Guará... Até que, horas depois, o Ademar com uma vassoura começou a varrer a calçada. Aí então comecei a me perguntar: seria isso uma sugestão dele? um pedido? uma indireta? Não... o Ademar não poderia estar querendo fechar o Bar... a música estava tão boa! Então, para agradá-lo - ou convencê-lo a manter o bar aberto -, coloquei para tocar precisamente "While my guitar gently weeps", também com o George Harrison. Afinal, na segunda estrofe dessa música o George diz exatamente o que o Ademar poderia estar pensando e fazendo: 

"I look at the floor and I see it needs sweeping
(eu olho para o chão e vejo que ele precisa ser varrido)
while my guitar gently weeps"
(enquanto minha guitarra suavemente chora) 

(George Harrison - fonte: http://www.thegearpage.net/board/showthread.php?t=1453519


     Depois de algumas poucas cervejas, pacotes e mais pacotes de amendoim com alimentos em conserva, vi que já era tarde. Eu era o único cliente no bar. Pedi a conta, paguei e fui embora... não sem antes agradecer ao Ademar, com um abraço, pela grande noitada.