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(Dresden Concerto in G major: Adagio - Vivaldi - por Alberto Martini)
"(...) acionando bombas
tirando lá do fundão
a lama vermelha
que vai correndo como sangue pela sarjeta
fecundar outras terras
levar a elas o vigor da nossa civilização!"
fecundar outras terras
levar a elas o vigor da nossa civilização!"
(S.Porto, em "Civilização")
O Raimundo encontrou no lixo uma caixa cheia de livros e a levou para sua loja de sapatos. Ali, amontoado em um canto, deixou-os entre cadeiras e armários velhos. Não se interessando por nenhum deles, e sem saber a quem doá-los, perguntou-me se eu não os queria.
Selecionei alguns deles e trouxe-os para a biblioteca do meu escritório. Dentre tantos escritores, professores e pensadores conhecidos estavam Guimarães Rosa, Dalmo Dallari, Sidney Sheldon e Emile Durkheim. Mas minha atenção ficou em um bem fininho, novinho, de capa simples e lisa: "Terra da Promissão - o poema das gentes e do café"*. Sebastião Porto**, seu autor, eu não conhecia.
Selecionei alguns deles e trouxe-os para a biblioteca do meu escritório. Dentre tantos escritores, professores e pensadores conhecidos estavam Guimarães Rosa, Dalmo Dallari, Sidney Sheldon e Emile Durkheim. Mas minha atenção ficou em um bem fininho, novinho, de capa simples e lisa: "Terra da Promissão - o poema das gentes e do café"*. Sebastião Porto**, seu autor, eu não conhecia.
No livro, que traz poemas dedicados à cidade de Ribeirão Preto, encontrei logo na primeira página um manuscrito datado de outubro de 1995. Ali, com um "afetuoso abraço", revestindo de pessoalidade suas páginas e seu conteúdo, o próprio autor dedicava o livro a alguém a quem chamou "bom amigo".
(Fonte: http://tdeduc.zip.net/arch2009-03-29_2009-04-04.html)
Enquanto caminhava em direção à rua, saindo da loja do Raimundo, ficava tentando imaginar e descobrir tudo o que havia se passado com o autor e com os antigos possuidores do livro.
- "Será que deixaram de ser amigos? Será que o 'bom amigo' faleceu e seus parentes e sucessores se desfizeram das coisas que foram deixadas? Por que será que não quiseram mais o livro? Como pode alguém dispensar assim um livro com uma dedicatória carinhosa, manuscrita pelo próprio autor? - eu me perguntava.
Com o livro nas mãos fiquei parado na esquina da loja do Raimundo por um bom tempo, olhando a dedicatória, e chateado por pensar no destino que lhe havia sido dado.
Com o livro nas mãos fiquei parado na esquina da loja do Raimundo por um bom tempo, olhando a dedicatória, e chateado por pensar no destino que lhe havia sido dado.
Depois, ansioso para folhear calmamente cada um daqueles livros, levei-os todos para o meu escritório. Lá chegando escolhi primeiro o do S. Porto e, em uma sentada só vi o café descobrir Ribeirão Preto; vi a Civilização arrancar do chão o sangue generoso da terra-roxa; sentei-me à sombra das figueiras da praça XV; fiquei admirando a fonte luminosa central; e - em especial - passeei pela Praça Luís de Camões - da qual tanto gosto. Eu estava certo de que tinha agora, em mãos, um belo manifesto de amor pela cidade.
(Praça Luís de Camões - foto: arq. pessoal)
Olhei novamente a dedicatória manuscrita com tinta azul e fiquei me imaginando ao lado do autor e do "bom amigo" naquele momento em que a dedicatória fora feita. Certamente foram muitos os sorrisos e os abraços carinhosos que trocaram. Uma amizade de quanto tempo? Quais os vínculos que os ligavam? O que costumavam conversar quando se encontravam?
Pensei bem... e mudei de ideia. Ao invés de ficar aborrecido com os antigos possuidores do livro, eu deveria mesmo era agradecê-los.
Em sua página final, agora, há uma dedicatória feita para mim - tanto pelo "bom amigo" quanto pelo Raimundo. Só eu a vejo. Não fossem eles eu não teria conhecido o talento literário e a sensibilidade do autor... Que, passando a morar em uma das estantes do meu escritório, vai estar vivo e sempre pronto para comigo dialogar em minhas horas de devaneio e poesia.
*Editora Legis Summa, 1995
**Sebastião Porto - já falecido, foi jornalista em Ribeirão Preto
Pensei bem... e mudei de ideia. Ao invés de ficar aborrecido com os antigos possuidores do livro, eu deveria mesmo era agradecê-los.
Em sua página final, agora, há uma dedicatória feita para mim - tanto pelo "bom amigo" quanto pelo Raimundo. Só eu a vejo. Não fossem eles eu não teria conhecido o talento literário e a sensibilidade do autor... Que, passando a morar em uma das estantes do meu escritório, vai estar vivo e sempre pronto para comigo dialogar em minhas horas de devaneio e poesia.
*Editora Legis Summa, 1995
**Sebastião Porto - já falecido, foi jornalista em Ribeirão Preto
Amei o texto, a sensibilidade e o valor dado ao livro e aos livros em geral.Quando escrevemos não somos mais donos de nossas palavras. Elas voam e, felizmente, as palavras de Sebastião Porto caíram em mãos de quem ama a leitura e valoriza o solitário ofício de escrever.
ResponderExcluirObrigado, Matilde, pela visita ao blog e pelo comentário. Seja sempre bem-vinda.
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