quarta-feira, 17 de junho de 2015

THANK YOU, RIBEIRÃO PRETO (ou O PAUL McCARTNEY NÃO VIU)


"alguma coisa está fora,
fora da nova ordem mundial"
(Caetano Veloso)


     Sábado, onze da manhã: pela Visconde de Inhaúma, desci para o Mercado Municipal. Atravessei a Lafayette, caminhei ao lado da Catedral, cruzei a Florêncio de Abreu e a Praça das Bandeiras, passando por entre as barracas da feira de artesanato.

 (A feira de artesanato - fonte: arq. pessoal)

     Parei no semáforo da Américo Brasiliense com a Tibiriçá, em frente ao ponto de táxi, aguardando  Aguardei o melhor momento para atravessar a rua. Do lado de cá da calçada havia um grande movimento no ponto de ônibus. 

(O ponto de ônibus na Amador - foto: arq. pessoal)

     Do outro lado, uma fila no quiosque de caldo de cana, onde, de uma pequena caixa com som distorcido e misturado com o ruído dos motores dos automóveis estava eu ouvi.... 
   - Ah lá lá lá á lá lá lá lá, Hey Jude...
    ... sim, "Hey Jude", dos Beatles. A mesma gravação do single "Hey Jude/Revolution, de 1968.

(CLIQUE NA SETA PARA OUVIR)
The Beatles - Hey Jude
https://www.youtube.com/watch?v=8moxANphYNk

     Segui caminhando por diversos quarteirões do centro, passando por imóveis antigos, por lojinhas de artigos baratos, por lojas de presentes, de tecidos, de roupas feitas, bares e salgaderias...

(Mercado Municipal - fonte: arq. pessoal)

     Lá no "baixadão", pela porta da São Sebastião, entrei no Mercado. No primeiro balcão, amontoados, vi canivetes, fivelas, chapéus, fumo em corda e lampiões. Os comerciantes, com seus produtos à venda, enchiam de cor e de estímulos os diversos corredores estreitos existentes entre os boxes. As embalagens de salaminho, das garrafas de azeite, dos potes de azeitonas, pimenta e champignon coloriam o local. Sacos de trigo grosso, temperos, amendoim, feijão, pimenta do reino em grão, tudo se juntava ali para dar ao Mercado um aroma e um charme muito especiais. 

(Tudo se amontoa nos pequenos espaços do Mercado - foto: arq. pessoal)

     Lá dentro, por mais improvável que possa parecer, ouvi novamente uma gravação dos Beatles na voz do Paul McCartney. Isso colocou em dúvida a minha própria realidade, e me fez pensar que a música ouvida anteriormente  estava se repetindo em minha mente. Mas o som, de boa qualidade, estava de fato presente, e se espalhava pelo Mercado.
     Entrei em um dos boxes, escolhi o que queria, e fui atendido por uma mocinha muito sorridente. Ela calculou o preço, e colocou minha compra em um saquinho de plástico. Paguei.


 (Vendedora de queijos e castanhas - foto: arq. pessoal)

     Continuei ouvindo aquela música dos Beatles. Teria sido muito mais provável ouvir, tanto ali quanto no quiosque de caldo de cana, um sertanejo universitário ou um funk - que retratariam as tendências do momento. Ouvir os Beatles duas vezes, em lugares diferentes foi, para mim,  um desarranjo edificante.  

(corredor interno do mercado - foto: arq. pessoal)

     Com uma sacolinha em minhas mãos, eu estava pronto para voltar para casa. No entanto não consegui deixar o Mercado. Atraído pelo som dos Beatles e com vontade de "encontrá-los" ali, caminhei "na direção deles" e cheguei em um box de canto onde funcionava uma pastelaria. Ali, em algumas mesinhas de plástico muito simples com banquetas também de plástico, os clientes se espremiam. A música saía nítida de duas caixas de som enormes. O Mercado dançava; a pastelaria fervia.
    - Ah, lá lá lá, lá lá lá lá, Hey Jude...
    Pessoas simples, mulheres de bermuda e sandálias de couro cru; homens de chapéu, cinturão com fivela de metal e botina de cano alto enchiam os copos de cerveja e conversavam animadamente tendo pratinhos de pastéis, coxinhas, e peixe frito ao centro das mesinhas. A tarde de sábado pintava-se de beleza. E a mesma gravação de "Let it Be" que estava sendo tocada no quiosque de caldo de cana agora se repetia, na voz do mesmo Paul McCartney de mais de quarenta anos passados. 
     Aquele movimento todo alegrou o meu dia e o dia de muita gente - acredito. Sei que o Paul McCartney tem noção de tudo o que as músicas dos Beatles inspiraram nas pessoas em lugares remotos, incertos e inimagináveis deste mundo. Ele poderia até imaginar como seria ouvir sua própria voz no Mercado Municipal de Ribeirão Preto se alguém com ele conversasse a esse respeito. Mas ele não viu, como eu vi, seu jeito de cantar e a música dos Beatles trazerem sentimentos bons a mim, e sorrisos para tantas outras pessoas. 
     Na fantasia ingênua de que, por um passe de mágica, ele tomou conhecimento de tudo o que observei naquelas horas do sábado, relato aqui essa história querendo crer que ele, o Paul, em um rincão qualquer do Reino Unido, e sem saber porque, de repente parou tudo o que estava fazendo e deu uma boa gargalhada sozinho. Em seguida, com toda a nobreza britânica de septuagenário, como quem estivesse pensando algo, olhou para loooonge e exclamou para si mesmo: "Thank you, Ribeirão Preto!"  


(Paul McCartney - Fonte: http://ultimateclassicrock.com/paul-mccartney-valentines-day-concert/)

2 comentários:

  1. Não só uma linda homenagem ao Paul McCartney, mas uma crônica do seu passeio pelo centro da cidade, com toda a descrição real das mercadorias, do 'cheiro' do pastel, do caldo de cana, do movimento intenso das pessoas na nossa cidade de Ribeirão Preto. Bacana, Elias!! Flávia

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Flávia. Fico contente em ler comentários seus. Obrigado.

      Excluir