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Bach - Ária da "Paixão Segundo São Mateus" - BWV 244 -Erbarme Dich
https://www.youtube.com/watch?v=BBeXF_lnj_M
"Cria em mim, Senhor, um coração puro,
e renova dentro de mim um espírito inabalável."
(Bíblia, Salmos 51:10)
Vi minha irmã conversando com um rapaz em frente ao cinema e fui dizer aos meus pais que ela estava namorando (sem que estivesse). Eu só queria fazer o circo pegar fogo - e a história era um prato cheio para as guerrinhas que acontecem entre irmãos. Como ela era ainda muito jovem, ouviu uma baita lição de moral e ainda foi punida com uma bronca terrível. E eu, hoje pensando no caso, lembrei que ainda tenho o crédito de uma premiação - que na época não recebi. Estávamos no final dos anos 60, e eu tinha meus nove ou dez anos de idade. Com o meu gesto - reconheço - acabara de me tornar um delator.
Sempre que ouço falar em delação o primeiro nome de que me lembro é o de Judas Iscariotis: por algumas moedas de prata ele entregou Jesus Cristo aos soldados romanos. No final, arrependido, suicidou-se.
"Beijo de Judas" - 1303/1305 - Giotto
Fonte: https://janeaustenrunsmylife.wordpress.com/2013/03/
Antes de Judas, antes ainda do nascimento de Jesus Cristo, Brutus já havia traído Júlio César (o imperador romano) e conspirado para o seu assassinato. Brutus tem, assim, a fama de ser o primeiro traidor da história. Suicidou-se, no final.
Muitos outros traidores apareceram por aí. Lembro-me de alguns.
Augusto Pinochet traiu Allende no Chile. Foi acusado da prática de diversos crimes, sofreu infarto em prisão domiciliar, e morreu de parada cardíaca.
Himmler, chefe da polícia nazista, tentou negociar a rendição da Alemanha aos aliados na segunda guerra. Tendo sido um dos responsáveis pela política de aprisionamento em campos de concentração e eliminação em massa, foi considerado criminoso. Também se suicidou.
Tommaso Buscetta, que na década de 80 buscou refúgio aqui no Brasil, entregou o esquema da máfia na Itália. Como recompensa ganhou proteção especial e um dinheirão: morreu de câncer. No entanto, a máfia não deixou por menos: acabou com a vida de muitos de seus familiares.
Augusto Pinochet traiu Allende no Chile. Foi acusado da prática de diversos crimes, sofreu infarto em prisão domiciliar, e morreu de parada cardíaca.
Himmler, chefe da polícia nazista, tentou negociar a rendição da Alemanha aos aliados na segunda guerra. Tendo sido um dos responsáveis pela política de aprisionamento em campos de concentração e eliminação em massa, foi considerado criminoso. Também se suicidou.
Tommaso Buscetta, que na década de 80 buscou refúgio aqui no Brasil, entregou o esquema da máfia na Itália. Como recompensa ganhou proteção especial e um dinheirão: morreu de câncer. No entanto, a máfia não deixou por menos: acabou com a vida de muitos de seus familiares.
Na história do Brasil há dois "grandes" traidores: Calabar e Joaquim Silvério dos Reis.
Quando os holandeses, na condição de invasores, aqui estiveram no século XVII, Domingos Fernandes Calabar os auxiliou em suas conquistas. Foi, por isso, taxado de traidor da pátria (apesar de alguns historiadores interpretarem seu envolvimento com os holandeses de forma diferente). Morreu na forca. Seus restos mortais foram esquartejados e espalhados em praça pública - assim como, futuramente, viriam a ser os restos mortais de Tiradentes.
Joaquim Silvério dos Reis, na Inconfidência Mineira do século XVIII, para escapar de suas dívidas com a Coroa portuguesa, delatou seu amigo Tiradentes e todos os demais inconfidentes. Como premio ganhou do governo português pensão vitalícia e perdão por todas as dívidas.
Com a deleção premiada, muito em voga hoje em dia, o investigado (ou acusado) ganha legalmente a oportunidade de tirar para si algum proveito: confessa um crime, delata os envolvidos, traz provas e novidades. Com isso é premiado com a redução dos danos na pena que lhe for aplicada.
Não coloco em questão os méritos ou deméritos desta lei (Lei 12850/13). Mas entendo que ela ajuda muito na persecução criminal. Como consequência, a traição no Brasil passou a ganhar novos adeptos. Nomes como Roberto Jefferson, Delcídio do Amaral, Nestor Cerveró, Paulo Roberto Costa, Alberto Youssef, Marcelo Odebrecht, Joesley Batista e Ricardo Saud entraram para essa lista. E muitos outros também estão sinalizando interesse em engrossar esse caldo.
Com tanta gente assim, a traição ficou banalizada. Surge um novo traidor-delator a cada dia. Tantos que Silvério dos Reis, que até há pouco ostentava o título de maior traidor do Brasil, corre o risco de perder essa sua posição de unanimidade no rol de nossos "gloriosos" traidores.
A redução dos danos da pena aplicada aos crimes praticados por delatores pode ocorrer. No entanto estou certo de que a culpa e a pecha de traidor-delator vai acompanhá-los intimamente pelo resto de suas vidas - assim como eu, que mesmo tendo recebido o perdão de minha irmã por aquela delação ocorrida há cerca de cinquenta anos, ainda hoje carrego no fundo da minh'alma o remorso, o peso e a vergonha de um dia ter sido um delator.
Daí que, na esperança de ainda receber uma premiação pelo crédito de delator que tenho, e inspirado no Salmo 51:10 da Bíblia, peço a minha recompensa:
- "Cria em mim, Senhor, um coração puro, e renova dentro de mim um espírito inabalável".