quinta-feira, 4 de abril de 2019

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"Não diga não" - Tito Madi


     O jornal "Folha de São Paulo", de hoje*, publica uma entrevista** concedida por uma das principais intérpretes brasileiras: Nana Caymmi. Nana acaba de lançar um CD inteiramente dedicado a Tito Madi: "Nana Caymmi canta Tito Madi".


Nana Caymmi Canta Tito Madi de Nana Caymmi

     Tito Madi (1929-2018) faleceu recentemente, aos 89 anos de idade. Compôs e cantou muitos sambas-canção. Alcançou relativo sucesso. "Não diga não", Chove lá fora", "Cansei de ilusões", foram alguns deles. Na bossa nova também deixou sua marca: "Balanço zona sul" é um dos clássicos do gênero. Em suas interpretações, em suas apresentações, em suas entrevistas, transmitia com naturalidade muita serenidade, paz, leveza... Há, entre obra e imagem do artista, uma grande coerência. Depois de ouvi-lo falar ou cantar, eu sempre reacendia esperanças nos rumos da humanidade: o mundo poderia ser melhor!
     Na entrevista concedida pela Nana Caymmi à "Folha de São Paulo", ela disparou palavras que, parece-me, combinam com ela, mas que não combinam em nada com o homenageado ou com as canções gravadas em seu novo CD. A meu ver, e em respeito ao Tito Madi e à sua obra, teria sido bom se a Nana tivesse cuidado melhor das coisas que disse. Não sugiro que ela deixe de ser autêntica, verdadeira consigo mesma.  A meu ver, a figura do intérprete precisa combinar com a música que interpreta, para que não pareça artificial. Pela entrevista à "Folha", a obra de Tito Madi não combinou em nada com a Nana Caymmi. 

     Ao se referir a seus ex-maridos, Nana chamou-os de merdas. ("Nunca tive um marido que gostasse [de ópera]. Uns merdas.").

     Ao dizer quantos maridos teve, explica: "Foi uma porrada".

     Falando de política, disse que Gil, Caetano e Chico Buarque são "chupadores de pau do Lula".

     Ao comentar a obra de seu pai, Dorival Caymmi, disse que dele já se esqueceram. Que somente em seu aniversário de morte "tem sempre uma macumbeira que se lembra de uma música qualquer...".

Folha de São Paulo, 29/03/19 - foto: arq. pessoal

     Em 1983 Nana gravou, com o pianista  César Camargo Mariano, o disco "Voz e Suor". Quando, na entrevista, comentou a gravação de "Não diga não" (uma das canções do disco de 1983), ela disse que o César Mariano ficava ensaiando a música, e ela pedindo para que ele parasse de estudar aquela "merda". Ainda, disse que a havia escolhido para dificultar as coisas para o César, para "botar no rabo dele, com farinha". 

     Ao comentar "Balanço Zona Sul", Nana disse que acreditava que, quando compôs, o Tito Madi estava em uma fase de ficar olhando "bunda" de mulher na praia. E mais: que Wilson Simonal e Elis Regina eram arrogantes e vaidosos.

     Ela conta que, na época do samba-canção (1945-1960), "era boateira, dançava que nem uma filha da puta... saía com as amigas para pegar homem".

     Falou também de Emílio Santiago: "Eu era cama e mesa com Emílio. Se a bicha não fosse bicha, eu estava casada com ela."

     Estranho pensar nisso, mas não consigo imaginar palavras ou expressões tais como "merda", "porrada", "chupador de pau", "botar no rabo", "filha da puta", "bicha", sendo ditas pelo Tito Madi: não combinam!

     No CD dedicado à obra do Tito Madi, Nana gravou onze músicas: Cansei de ilusões, Chove lá fora, Carinho e Amor, Não diga não, Quero-te assim, Sonho e saudade, Canção dos olhos tristes, E a chuva parou..., Graças a Deus você voltou, Gauchinha bem querer, Balanço Zona Sul.

     Os termos da entrevista concedida pela Nana Caymmi à Folha não cabem na beleza das músicas gravadas por ela no CD: passam distantes. Quero crer que a necessidade de estar na mídia tenha sido o Norte escolhido para a entrevista. Se assim foi, o objetivo da estratégia publicitária foi alcançado: porém, para mim, de uma forma muito negativa, que não condiz nem um pouco com o que a Nana construiu em sua vida artística.

     Por tudo isso, prefiro continuar ouvindo as antigas gravações do Tito Madi, em sua própria voz. Não quero maculá-las com a delicadeza artificial expressa nas gravações feitas pela Nana Caymmi - apesar da boa qualidade técnica. 

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*Folha de São Paulo, 29/03/2019 
**""Nana Caymmi ataca Chico e Caetano e afirma ter confiança em Bolsonaro" - Caderno "Ilustrada", página C4 

2 comentários:

  1. Elias, assino embaixo seu texto. Não li a matéria da Nana, mas ela sempre foi assim desbocada. No entanto, você tem razão: não combina nada com as canções de Tito Madi. Só acho que você foi comedido: Tito Madi fez bastante sucesso em sua época. Cantávamos quase todas as canções que ele gravou. Grande abraço!

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    1. Obrigado, Saint-Clair. Perfeito seu comentário. Obrigado. Grande abraço.

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