terça-feira, 5 de junho de 2012

CONVERSANDO COM OS "MESTRES" (ou "PORTINARI DO BRASIL")


Cândido Portinari - obras e releituras
https://www.youtube.com/watch?v=kKZ-wvYHW0Y

     Gauguin, Velazquez, Monet, Degas e muitos outros estão juntos na prateleira de cima de uma das estantes do meu escritório. Colocados capa a capa formam a coleção “Grandes Mestres”, editada em 2011 pela “Abril S.A.” Cada um deles, a seu modo e ao seu tempo, por seus olhos, pintou e universalizou seu mundo. São vinte e cinco “Mestres” que passam seus dias aqui comigo. Gosto de pensar que eles, numa infinita paciência e por intermédio de suas obras, estão sempre dispostos a dialogar comigo.
     Ainda agora, “Degas” na mão, e refletindo sobre sua mensagem para a construção do Homem, levantei a cabeça e fixei o olhar em um pequeno quadro do Vinícius de Moraes, pintado pelo Portinari, e que está pendurado em uma das paredes do meu escritório. Olhando o quadro fiquei com a impressão de que o Portinari estava manifestando, por intermédio de mim, um desejo seu de também participar da minha conversa com o Degas. Desviei minha atenção então do Degas para o Portinari, e lembrei-me do Juscelino Kubitscheck, em tamanho natural, pintado pelo Portinari, exposto na entrada de sua biblioteca no Memorial JK em Brasília.
Entrada da Biblioteca JK -Memorial JK, Brasília/DF -ao lado do Juscelino Kubitscheck pintado por Portinari - acervo pessoal)
     Lembrei-me também dos murais “Guerra e Paz”, pintados pelo Portinari, e que estão na sede da Organização das Nações Unidas em Nova Iorque; ouvi meu coração cantar “Un son para Portinari”*, e ainda reli mentalmente os poemas “A Mão”, do Drummond,
“(...) A mão cresce e pinta
O que não é para ser pintado, mas sofrido (...)”
e “Poema para Candinho Portinari”, do Vinícius,
“Lá vai Candinho!
Pra onde ele vai?
Vai pra Brodósqui
Buscar seu pai! (...)”  
- ambos escritos em homenagem ao Portinari na ocasião de sua morte, em 1962.
(Homenagem, na Pça Cândido Portinari, do povo de Brodósqui ao seu conterrâneo - acervo pessoal)

(Praça Cândido Portinari, vista do portão de entrada da Casa de Portinari - Brodósqui, SP - aceervo pessoal)

Museu Casa de Portinari - Brodósqui, SP - acervo pessoal)

     Dostoiévski dizia que “falar da própria aldeia universaliza”. De fato. E Candinho – o Portinari -, depois de um tempo na Europa, voltou para o Brasil. A obra dele universalizou-se e tomou vulto a partir do momento em que ele, tomado de encantamento por sua terra, passou a pintar sua realidade e seu país: “Menino com estilingue”, “Mestiço”, “O Lavrador de Café”, “Retirantes”, “Algodão”, “Baile na Roça”...
("O Lavrador de Café" - Portinari, 1939)

     Com esses pensamentos na cabeça eu me levantei e olhei cara a cara para os “Grandes Mestres” enfileirados na estante. Dei-me conta de que não havia nenhum brasileiro dentre eles. Calados, eles me observavam. Não diziam nada...  
     - “Envergonhados? Apequenados por não terem aberto espaço para o Portinari?”, “acham justo?” – perguntei a eles silenciosamente.
     De imediato ouvi internamente suas vozes me respondendo que eles não haviam sido os responsáveis pela escolha de quem deveria ou não estar ali, que também achavam que Portinari merecia na coleção um lugar de destaque.
     Compreendi.
     Mas, desconfortável ainda com a incompleta seleção de Mestres feita pelos editores, ergui a cabeça e recoloquei o Degas na estante. Por fim, inconformado com meus interlocutores invisíveis e materializados em papel, determinei:
     - “O Portinari tem sim lugar de honra junto de vocês. Ele está e vai ficar aí para sempre, aberto ao diálogo!”.
     Em seguida coloquei entre o Goya e o Leonardo da Vinci uma biografia do Portinari da coleção “A Vida dos Grandes Brasileiros”, editada em 1974, e que tenho desde a época do colégio. Aí sim, fiquei mais tranquilo...
     Tendo feito isso, em minha mente pude ver todos os Mestres se ajeitando na estante, rendendo suas homenagens ao Portinari, e dando-lhe as boas vindas com aplausos que só eu pude ouvir.

_________________________________________
*"Un son para Portinari" - de Nicolás Guillen e Horacio Salinas, gravado por Mercedes Sosa


5 comentários:

  1. vC TEM UMA ALMA MUITO SENSÍVEL E CONSEGUE CAPTAR SONS E IMAGENS AO SEU REDOR E CONSEGUE NOS TRANSMITIR ISSO MUITO BEM. pARABENS PELO TEXTO E PELA BELA MÚSICA...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado, Rose Marie. Seja sempre bem vinda ao "Ipê Amarelo".

      Excluir
  2. Elias, parabéns pelo tema. Vc fez justiça ao colocar Portinari dentre os melhores artistas mundiais. Nada mais justo.
    Eu particularmente gosto muito de Portinari, tanto assim, que possuo em minha sala uma bela réplica de suas obras: "Pampulha - São Francisco de Assis" de 1944. Elias, e continue nos permitindo navegar nesse mar de sensibilidade que você tanto irradia. Abração.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Ah, o Portinari merece estar entre os grandes artistas de todos os tempos. Legal saber que também tem em sua sala uma réplica da "Pampulha..." por Portinari. Obrigado pelo comentário. Abraço.

      Excluir