terça-feira, 4 de dezembro de 2018

UMA HISTÓRIA PARA SER LEMBRADA


CLIQUE NA SETA PARA OUVIR ENQUANTO LÊ

Stefan Schimitz - "Eterna Saudade" (Dilermando Reis)
https://www.youtube.com/watch?v=oyKgvPJsFPk


     Vou contar uma história. Uma história de gente do interior. Uma história da qual eu não quero me esquecer. Não quero me esquecer porque também é minha. Uma história cujo tema é a amizade e o tempo: o tempo implacável que faz com que nos aproximemos ou nos distanciemos daqueles com quem convivemos um dia.

     Pois então, deixe-me contá-la...

     Um dos meus tios teve um grande amigo. Desde a juventude conversavam, reuniam-se diariamente com amigos comuns, sentavam-se em botecos com cadeiras nas calçadas, iam a ranchos em beiras de rios, festas e comemorações cívicas.

     Juntos debatiam as carências do município, propunham soluções para os problemas da cidade e erguiam bandeiras.

     O tempo passou; a mocidade passou. Cada qual constituiu sua própria família e seguiu seu próprio caminho: meu tio tornou-se comerciante; seu amigo, médico.

     Muitos anos depois, amenizadas as batalhas pela vida, os dois retomaram o hábito dos encontros frequentes. Não mais em bares ou em ranchos em beiras de rios.

     Sentavam-se à porta de entrada da loja de calçados do meu tio, na esquina da estrada de ferro com a rua principal, e ali passavam boa parte do dia.

     Assim como na história, os acontecimentos na cidade se repetiam. Não havia muito o que comentar. Observavam o passar das horas. Relembravam. O silêncio não os incomodava. Ficavam ali. Vigiavam o tempo. Ocasionalmente uma palavra, uma recordação... um lamento, um sorriso...

Dr. Leão e meu tio Milim - porta de entrada da loja de calçados, em algum lugar no tempo
foto: arquivo pessoal - Sahid Elias Antônio

     Ao fundo da mesma loja de calçados, na qual, quando menino, eu também costumava passar muitas das minhas horas, senta-se ainda hoje o meu tio. Vou vê-lo sempre que possível. Outros conhecidos o visitam com frequência... O antigo amigo, o médico, mesmo tendo partido há anos, continua por ali, ao lado do meu tio, na condição de nome de avenida: a avenida viva em palmeiras que, "passando" ao lado da loja e atravessando toda a cidade, substituiu a antiga estrada de ferro.

     Revendo uma foto de um de seus encontros diários, fico pensando:

     - Os melhores diálogos dispensam formalidades. Às vezes, dispensam também palavras. Ter um antigo amigo ao lado é o que basta: a mesma consideração, o mesmo lugar, a mesma solidariedade implícita, a mesma recordação. A presença certa, espontânea e incondicional, é a maneira mais terna de se rezar em silêncio uma mesma oração... e dar amparo à condição de desamparados à qual estamos todos submetidos...


Eu, meu tio, minha avó, nosso amigo Toufic
Calçada em frente à entrada da loja (Foto: arq. pessoal, 1987)

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

WILD IS THE WIND*


(CLIQUE NA SETA PARA OUVIR)
(Nina Simone - "Wild is the wind" - 1957 - de Tiomkin/Washington)
https://www.youtube.com/watch?v=LtVvcgjAaNg

     Dentre um incontável número de poderes mágicos, a música consegue retirar de nossas profundezas adormecidas fatos ou momentos que, um dia, nos foram importantes. Cada um tem, ao longo de sua própria existência, momentos assim, preciosos. É claro... uma música que, para um, ilustra uma recordação, é diferente daquela que o faz para outro - a não ser que a situação específica tenha sido vivenciada em conjunto - mas isso já é outra conversa.

     Lendo agora, nas redes sociais, postagens recentes de duas amigas que me foram muito próximas em fases de vida distintas, descobri que a voz e o canto da Nina Simone, em algum momento e por algum motivo, foram importantes para cada uma delas, separadamente.

New Release: Nina Simone, THE COLPIX SINGLES
Nina Simone
https://www.rhino.com/article/new-release-nina-simone-the-colpix-singles


     A Nina Simone (1933-2003), apesar de ter estudado piano clássico, transitou por diversos estilos musicais - blues, pop, folk, canções francesas, cânticos africanos... Há, inclusive, em seu repertório, uma bela gravação de "Feelings" - do brasileiro Morris Albert. Tendo definido a si mesma como "rebelde", Nina Simone, pela música, engajou-se nas lutas pela emancipação feminina e pelos direitos civis dos afro-americanos.

     No entanto, pelas postagens que vi, a Nina Simone de minhas amigas não é a ativista de "Mississippi Goddam" ou de "Why (the king of love is dead)". Para elas, a Nina é simplesmente a mulher fora de padrão... a intérprete de "I put a spell on you" e "Don't let me be misunderstood".   

     Desejando que essas minhas amigas estejam bem, e lembrando-me delas com o mesmo carinho e consideração que por elas sempre tive, busco algo forte e suave, da Nina Simone, para poder ouvir calado. Começo por sua gravação de "Wild is the wind". Coloco essa mesma música para tocar continuamente ao longo das horas que vão se passando. Não me canso de ouvi-la, de repeti-la, diversas vezes seguidas... 

     Tenho também momentos assim, inesquecíveis. Dou-me conta de que "Wild is the wind", na voz da Nina Simone, em outros tempos, embalou alguns dos que me foram muito especiais. Especiais de tal forma que, a cada vez que a ouço, vejo despertar o que ficou parado lá atrás, esquecido no tempo, aguardando pacientemente para despertar, com muita vitalidade, a partir de um cantinho escuro do meu baú de memórias... 




Wild Is the Wind

Love me love me love me
Say you do
Let me fly away
with you
For my love is like
the wind
And wild is the wind

Give me more
than one caress
Satisfy this
hungriness
Let the wind
blow through your heart
For wild is the wind

You...
touch me...
I hear the sound
of mandolins
You...
kiss me...
With your kiss
my life begins
You're spring to me
All things
to me

Don't you know you're
life itself
Like a leaf clings
to a tree
Oh my darling,
cling to me
For we're creatures
of the wind
And wild is the wind
So wild is the wind

Wild is the wind
Wild is the wind
O Vento É Selvagem

Me ame, me ame, me ame
Diga que me ama
Me deixe voar pra longe
Com você
Porque meu amor
É como o vento
E o vento é selvagem

Dê-me mais
Do que só uma carícia
Satisfaça essa
Avidez
Deixe o vento
Soprar em seu coração
Porque o vento é selvagem

Você...
Me toca...
E eu ouço sons
De bandolins
Você...
Me beija...
E com o seu beijo
Começo a viver
Você para mim é a primavera
É todas as coisas
Para mim

Você não sabe que você
É a vida em si?
Como uma folha se prende
À árvore
Oh, meu amor
Se prenda em mim
Porque somos criaturas
Do vento
E o vento é selvagem
O vento é selvagem

O vento é selvagem
O vento é selvagem

_________________________________
*Wild is the wind" (o vento é selvagem) - Música composta por Dimitri Tiomkin e Ned Washington. Da trilha sonora do filme, de 1957, com o mesmo nome, dirigido por George Cukor ("Fúria da Carne", no Brasil).

domingo, 4 de novembro de 2018

JANELAS ABERTAS


CLIQUE NA SETA PARA OUVIR ENQUANTO LÊ
Gal Costa - "Janelas Abertas" (Tom e Vinícius)
https://www.youtube.com/watch?v=447QE2yVQg0


"Eu poderia ficar sempre assim,
como uma casa sombria,
uma casa vazia, sem luz nem calor.
Mas, quero as janelas abrir (...)"
(Vinícius de Moraes)


     Distante, muito distante, encerro-me em um pequeno quarto de hotel. Nada trouxe na bagagem, além do que me é estritamente necessário: a lembrança de dias felizes, a saudade de meus mortos queridos, o sentimento de gratidão pela vida, alguns conselhos, projetos que deixei de lado...

     Junto à parede interna do quarto há uma pequena cama de solteiro. Vestida do algodão branco do lençol que a cobre, e do travesseiro, não muito alto, acomodado em sua cabeceira, ela oferece o seu conforto para o repouso do meu corpo. Ao seu lado, um criado-mudo sustenta um delicado abajur para minimizar a escuridão da noite. O guarda-roupa, embutido na parede, tem o tamanho ideal para que não haja desperdício de espaço. Rente à janela, uma mesinha de madeira com uma cadeira é tudo do que preciso, para dar pouso aos meus cotovelos nas minhas horas de inspiração.

Файл:Camera da Letto Vincent van Gogh.jpg
Van Gogh - "Quarto em Arles" (1888)
https://ru.wikipedia.org/wiki/%D0%A4%D0%B0%D0%B9%D0%BB:Camera_da_Letto_Vincent_van_Gogh.jpg

     Essa simplicidade me faz feliz... e, momentaneamente, completa-me.

     Mas, para que o ar possa circular pelo quarto, por detrás da cortina uma janela deve ser aberta. Quando destravo seus trincos, o céu, o sol, as cores e as vozes da natureza ocupam o ambiente. E o pequeno quarto, feito uma nave, preenchido por tanta beleza, leva-me para longe, para bem longe... para muito além das suas paredes...

CLIQUE (2X) NA SETA
Laguna, SC 
Video: arq. pessoal (2014)  

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

O JOELHO, OS ÓCULOS E O CHANCELER



     Todo mundo sabe que o Vinícius de Moraes adorava compor, ler e trabalhar, durante demorados banhos de imersão. Há uma foto sua, na banheira, que nunca consegui entender bem. Nela, o poeta dobra a perna direita, e ajeita, um pouco abaixo do joelho, os seus óculos.


Vinícius de Moraes
Foto no facebook, por Marta Rodriguez Santamaria

     Sempre que a vejo, fico me perguntando: "o que será que o poeta queria dizer com tal 'montagem'?"


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"Eu não tenho nada a ver com isso" - Toquinho/Vinícius
(contam que o título original dessa música era "Deixa o Brasil andar")
https://www.youtube.com/watch?v=EtWn1p4_f9M


     Outro dia, uma amiga, que foi muito próxima do Vinícius, disse-me que o próprio poeta contou a ela que, naquela montagem, ele estava fazendo troça do chanceler que o havia exonerado do Itamaraty; que seu joelho, "de óculos", era a cara do tal chanceler.

     A História conta que Vinícius foi expulso do Ministério das Relações Exteriores em abril de 1969, com base no Ato Institucional nº 5, de dezembro de 1968. Antes, porém, uma Comissão havia sido montada (Comissão de Investigação Sumária) para investigar vidas privadas, e para expulsar diplomatas que o regime tachava de homossexuais, alcoólatras ou emocionalmente instáveis: Vinícius foi um dos punidos, apesar dos registros do Ministério das Relações Exteriores revelarem que ele era considerado um diplomata exemplar: sua vida boêmia, contudo, desagradava à linha-dura da época. Vinícius não foi o único: foram cassados 44 servidores, sendo 13 diplomatas, oito oficiais de chancelaria e 23 funcionários administrativos*. Sua cassação foi assinada pelo então Ministro das Relações Exteriores, e pelo presidente Costa e Silva**.

     - "Mas quem era, afinal, o chanceler que exonerou o Vinícius do Itamaraty?"

     Bom. De março/67 a outubro/69, o Ministro das Relações Exteriores do Brasil era o advogado, economista, banqueiro e político mineiro, José de Magalhães Pinto. Será, então, que era mesmo a ele que o Vinícius queria se referir?

     Veja a foto do então Ministro, e compare-a com o "joelho de óculos", do Vinícius: "alguma semelhança?"

 
José de Magalhães Pinto
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_de_Magalh%C3%A3es_Pinto


     - "O que você acha?" 

    Só sei que os tempos são outros. E, seja lá como for, "Deixa o Brasil andar...!"


_____________________ 
*conforme artigo de Bernardo de Mello Franco, publicado no jornal "O Globo", de 28 de junho de 2009. Esse artigo está no seguinte livro: "Embaixador do Brasil - Vinícius de Moraes". Brasília: FUNAG, 2010, 132 p. (FUNAG é a Fundação Alexandre de Gusmão. Vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, a FUNAG tem a finalidade de levar à sociedade civil informações sobre a realidade internacional e sobre aspectos da pauta diplomática brasileira).
**A Lei 12.265/2010, que reabilitou o poeta ao Itamaraty, promoveu-o, "post mortem", a Ministro de Primeira Classe da Carreira de Diplomata. Na Câmara dos Deputados, o único deputado a se manifestar contra a promoção foi o militar da reserva, e deputado pelo então PP-RJ, Jair Bolsonaro (fonte: o mesmo livro acima mencionado)


sábado, 6 de outubro de 2018

"O INCORRUPTÍVEL"


CLIQUE NA SETA PARA OUVIR ENQUANTO LÊ
(assista depois da leitura)
"Ah! Ça ira" - canção revolucionária francesa (1790)
https://www.youtube.com/watch?v=yZeuu05PV2U


     Houve um tempo em que reis governavam a França. Na corte, os desperdícios eram exagerados; os desmandos eram generalizados, e apenas alguns grupos eram privilegiados. A população, sacrificada e explorada, estava insatisfeita com a péssima administração econômica do país que estava ruindo. Era necessário que o sacrifício do povo revertesse em benefício do coletivo, e não apenas de poucos. O povo já não suportava mais a sensação de estar sendo roubado.

     Para que essa forma de governar fosse modificada, uma Revolução teve que ser processada. E que Revolução!

     Essa Revolução, a Francesa, aconteceu no ano de 1789. Seus objetivos eram de por fim a privilégios, com a consequente instalação de um Estado voltado para o bem comum. A vontade geral era o que deveria prevalecer. Queria-se que esse Estado fosse, enfim, governado sob os princípios da moralidade, da igualdade e da virtude.

     Para assentar tais ideais, vigorou na França, por um tempo, após a "derrubada da corte", um regime de terror. Esse regime proclamava que justiça rápida, violenta e inexorável, deveriam ser expressão de virtude. Assim, para a imposição da moral e da virtude "a qualquer preço", a Constituição de 1791 foi suspensa, e um órgão executivo denominado "Comitê de Salvação Pública" foi criado. Esse órgão, que teve um político chamado Robespierre como figura de destaque, comandava o exército e administrava as finanças do país. Para fazer valer os seus comandos, esse "Comitê" outorgou uma Lei ("Lei dos Suspeitos") dispondo que todas as pessoas suspeitas, que ainda estivessem em liberdade e que se mostrassem partidários de ideias contrárias às que estavam sendo impostas, deveriam ser colocadas em estado de prisão. O "Comitê" sancionou ainda uma outra lei ("Lei do Máximo Geral"), que instituía preços fixos para víveres e salários. Essas duas leis caracterizaram o que muitos historiadores chamam de "Regime do Terror". Ainda, para que fossem devidamente executadas as determinações do "Comitê", um "Tribunal Revolucionário" foi instalado.

     Esse estado de paranoia, de turvamento da razão, não poderia ter dado em outra coisa: durante o período em que vigorou (1793-1794), os chamados inimigos do Estado foram executados. Muita gente foi guilhotinada: dezenas de milhares.

Execução de Luis XVI
http://www.universiaenem.com.br/sistema/faces/pagina/publica/conteudo/texto-html.xhtml?redirect=43305128226733417061548245250

     No fim das contas, e em virtude das arbitrariedades perpetradas, Robespierre (apelidado de "incorruptível"), pela força, foi destituído de seus poderes, e, em seguida, decapitado (tal como ocorrera com Luis 16, o Rei da França, anteriormente destituído).

     A Revolução Francesa mostra, portanto, que, da tentativa de imposição da virtude, pela força, e sob o pretexto de resgate da moral e dos bons costumes, os autoproclamados "incorruptíveis" sempre procuram impor um regime persecutório e castrador de liberdades, que leva muita gente à morte.

     De tempos em tempos essa mesma história é repetida em muitos lugares do Planeta: queira Deus que, aqui no Brasil, esses mesmos acontecimentos não se repitam; que usurpadores da pátria e tiranos travestidos de puros sejam apenas tristes lembranças de um passado... que passou.

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

TITO MADI


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Tito Madi, dele, "Sonho e Saudade"
trecho do filme "Amor para três" (Dir.: Carlos Hugo Christensen, 1959/1960)
https://www.youtube.com/watch?v=IoPBL_AHhfM


     Passei algumas noites da semana assistindo, pelo "youtube", aos depoimentos, histórias e entrevistas que foram feitas com o Tito Madi. Ao mesmo tempo, deixei no meu carro um pequeno pacote contendo suas gravações em CD, para que eu pudesse ouvi-las quando quisesse. Ainda hoje, enquanto eu dirigia para o trabalho, ele "veio" comigo cantando e recontando suas histórias vividas em Pirajuí (SP) - sua terra natal.

     "Chove lá fora"* é sua música mais conhecida. Ela foi gravada, inclusive, pelo famoso grupo vocal norte-americano "The Platters".

     Lembro-me de que, no final da década de 70, um colega que tive na universidade ganhou de presente, de uma colega sua, sobrinha do Tito Madi, um autógrafo dele, especificamente destinado ao meu amigo. Achei o presente genial.


Tito Madi (1929-2018)
http://www.plugadosnanoticia.com/2018/09/compositor-tito-madi-morre-aos-89-anos.html

     Gosto de ouvir suas gravações. Gosto de sua fala, de seu canto. Gosto de saber da existência de um alaúde dependurado em uma das paredes de sua casa...

     Tito Madi faleceu ontem (26/09), no Rio de Janeiro, aos 89 anos de idade. Hoje, "a noite certamente vai estar fria"... e, muito provavelmente, estará "chovendo lá fora".

_____________________________
*"Chove lá fora" (canção gravada em 1957, pela Continental, no álbum com o mesmo título) - foi o maior sucesso na carreira de Tito Madi - Versos introdutórios: "A noite está tão fria, chove lá fora...")

terça-feira, 18 de setembro de 2018

A CASA DA ESQUINA


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Baden Powell - "Por Causa de Você" (Tom/Dolores)
https://www.youtube.com/watch?v=2wLmOZdiSu0


     Sou a memória de um tempo. Já tive flores em meus jardins. Minhas janelas viviam abertas. Por minhas portas entravam amigos...


Palacete Camilo de Mattos - esquina R Duque de Caxias c/ Tibiriçá, em frente à Praça XV
(Ribeirão Preto, SP) - Fonte: arq. pessoal (09/2018)


     Hoje, em minha vizinhança, há somente agências bancárias e lojas de departamentos: todas impessoais. Por suas portas entram apenas clientes. Em lugar de flores, há anúncios luminosos. Em lugar de janelas abertas, há vidros blindados e dispositivos de segurança...

     Guardiã de memórias que teimam em sobreviver, a despeito de sua suposta inutilidade, resisto à frieza funcional. Meu abandono está escancaradamente exposto... minhas janelas estão destruídas... minhas flores estão mortas: sou apenas um imóvel cadastrado em uma repartição pública.

     Acompanhada de antigos fantasmas, na escuridão da esquina movimentada  eu olho para a praça principal da cidade grande... dessa cidade tão cheia de pressa para ir... para ir não se sabe para onde...

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

BRANCA


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Jacques Klein e Ezequiel Moreira - "Branca" (Zequinha de Abreu)
https://www.youtube.com/watch?v=OpzPmQQlRXU


     Vou contar uma história. Uma história de gente de cidade pequena. De gente que passa muitos anos da vida remoendo, em segredo, um sentimento amoroso que se assemelha a um sofrimento. Trata-se, portanto, de uma história de amor. De um amor que, tendo brotado de um coração sensível, floresceu em valsa, encantou e virou filme.


Tônia Carrero e Anselmo Duarte (no filme "Tico-tico no fubá" - Dir, Adlofo Celi, 1952)
Fonte: http://bonavides75.blogspot.com/2013/08/filme-tico-tico-no-fuba-de-1952.html


     Assisti no cinema. Começa o filme com a chegada de um circo a uma cidadezinha do interior do Brasil. Dentre os diversos artistas que com ele chegam, está Branca - uma bela amazona. Por ela, Zequinha, um jovem funcionário público municipal e também pianista amador, apaixonou-se. Por poucos dias viveram um grande amor.

     Mas, encerrada a temporada do circo naquela cidade, encerrou-se, também, o relacionamento amoroso entre Branca e Zequinha. Cada qual seguiu sua vida. 

     Anos mais tarde, em uma cidade grande, Zequinha, agora pianista profissional, reencontrou sua antiga namorada. Logo após revê-la, e, para ela ter executado a valsa "Branca", por ele composta, sentiu-se mal, foi para a rua, e, no chão, terminou sua história.

     Assim é o enredo do filme.

     A história, contada no cinema, foi inspirada na vida e na obra de Zequinha de Abreu*. Das composições de sua autoria, é da valsa "Branca" que mais gosto. Sempre que a ouço, fico pensando se Branca foi uma musa verdadeira, ou se foi simplesmente fruto de sua imaginação.

     Pelo que se conta**, Branca realmente existiu. Conta-se que ela era filha do chefe da estação ferroviária de Santa Rita do Passa Quatro (SP) - um senhor que também era músico da orquestra regida por Zequinha de Abreu. Não se pode afirmar, ao certo, se houve ou não paixão de Zequinha por Branca. O que se conta é que ela casou-se (não com Zequinha), teve uma filha, separou-se, foi professora de violão e piano, e morreu em 1980 aos 74 anos de idade.

     "Branca" (a valsa) foi gravada no ano de 1931, no mesmo disco que lançou "Tico-Tico no Fubá" - choro que deu título ao filme comentado. Em Santa Rita do Passa Quatro, "Branca" é nome de rua... e Zequinha de Abreu, célebre compositor da música popular brasileira, é um cidadão imortal.


CLIQUE NA SETA PARA ASSISTIR
(PEQUENO TRECHO DO FILME)
"Tico-tico no fubá" - (Brasil, 1952. Dir.: Adolfo Celi)
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=PYyM594V8lA
_________________________________________
*José Gomes de Abreu (Zequinha de Abreu) - (1880-1935) - compositor, natural de Santa Rita do Passa Quatro (SP). Faleceu de ataque cardíaco em um hotel no centro de São Paulo.
**Pesquisa: http://www2.carosouvintes.org.br/o-imortal-zequinha-de-abreu-%E2%80%93-parte-2/ 

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

O PROGRAMA "ENSAIO", E A CAIXA DE PAPELÃO


CLIQUE NA SETA PARA OUVIR DURANTE A LEITURA
Lúcio Cardim, dele, "Matriz ou Filial"
https://www.youtube.com/watch?v=VQE12FfBLio


     Estou aqui, quieto, maravilhado, olhando para uma caixa de papelão que me foi endereçada. Fechada, ela traz, do lado esquerdo, o meu nome escrito em uma fita adesiva; do lado direito, o nome de um ser generoso, que confiou a mim a guarda temporária de um tesouro: Ricardo.


Fonte: arq. pessoal (2018)

     O Ricardo, além de outras virtudes, é membro de uma banda de jazz (e outros gêneros), que se reúne para ensaiar, em uma chácara, todas as segundas-feiras, à noite. Encontrei-o na loja do SESC-Ribeirão Preto, em uma manhã de sábado. Dentre o pouco que conversamos, ele me falou a respeito de uma coleção, da qual é possuidor, composta por oito caixas contendo livros e CDs, chamada "A música brasileira deste século, por seus autores e intérpretes". Durante a conversa, descobri que se tratava da gravação de muitos dos programas "MPB ESPECIAL" e "ENSAIO", produzidos pelo genial Fernando Faro*. Estes programas foram exibidos, inicialmente, nos anos 70, pela TV Tupi, e, a partir do final dos anos 80, pela TV Cultura. Após a morte de Fernando Faro, em 2016, a TV Cultura exibiu, por um tempo, reprises antigas do programa.

     O formato do ENSAIO é muito legal. Nele, o artista é mostrado em "closes"**, responde as perguntas que lhe são formuladas, canta, fala de sua trajetória artística e relembra casos vividos. Não se ouve a voz do entrevistador. Há intervalos preenchidos com o silêncio. Mas, de alguma forma, o silêncio aliado ao "close" também comunica: os movimentos das mãos do artista, sua expressão facial... tudo isso preenche o silêncio. Como resultado, nasce na gente, enquanto ouvintes ou telespectadores, uma certa cumplicidade com o artista. Lembro-me de ter assistido, nesse programa, o Vinícius de Moraes, o Cartola, o Dick Farney, a Nora Ney, o Lúcio Cardim, a Elis Regina e muitos outros. Foram programas antológicos. Nunca pude me esquecer dos que assisti. 

     Mas, só durante a conversa com o Ricardo fiquei sabendo que o SESC, em parceria com a Fundação Padre Anchieta, havia editado um pacote - aliás, oito pacotes - contendo alguns dos programas gravados até o ano de 2003. Em cada pacote, contou-me o Ricardo, estão cerca de doze artistas - doze CDs. E mais - disse-me ele: além do CD contendo a gravação do programa, cada pacote traz também um livro com a transcrição da entrevista de cada um dos doze entrevistados (de cada pacote).

     Ali na loja do SESC, naquela manhã, não tive dúvida (Você teria?). Ao ouvir o Ricardo comentar sobre os oito pacotes com os programas MPB ESPECIAL e ENSAIO, pedi que ele me emprestasse tudo - todas as oito caixas, todos os CDs e todos os livros. E com urgência!

     Pois é isso que eu queria te contar, meu caro leitor. Ao receber hoje, logo de manhã, uma mensagem do Ricardo, via whatsapp, dizendo que havia deixado na portaria do prédio onde reside, como empréstimo, uma caixa com os pacotes de CDs (e livros) contendo os programas gravados e editados, passei por lá, antes mesmo de qualquer outro compromisso ou atividade programada para o dia, e peguei a tal caixa.

     Posso então dizer que sou um homem feliz. Tenho diante de mim uma caixa de papelão, e, dentro dela, um tesouro. Olho para a caixa e sinto no peito uma grande ansiedade: estou acompanhado de artistas e intérpretes brasileiros que fizeram parte de minha formação, e que agora vão me contar suas histórias... 

     Abro a caixa e começo ouvindo o Lúcio Cardim***...

__________________________
*Fernando Faro - (1927-2016) Fernando Abílio de Faro dos Santos, sergipano, foi um jornalista, produtor musical, e diretor de programas de televisão.
**CLOSE UP (do inglês, "com aproximação"), ou usualmente, somente CLOSE é uma expressão comum em fotografia, e que significa um plano onde a câmera está muito perto da pessoa ou objeto em questão, possibilitando uma visão próxima e detalhada.
**Lúcio Cardim - (1932-1982) cantor, compositor e boêmio, nascido em Santos/SP.

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

CORAÇÃO SELVAGEM - AOS 120


CLIQUE NA SETA PARA ASSISTIR ENQUANTO LÊ
Belchior, dele, "Coração Selvagem"
https://www.youtube.com/watch?v=fR1XQgNiT0M


"Vem viver comigo, vem correr perigo"
(Belchior)


     "Coração Selvagem", do Belchior, retrata muito bem o jeito que eu gostaria de ser: eternamente jovem, instintivo, valente, intenso, despreocupado, inconsequente...

     Gostaria que os meus amigos, quando ouvissem "Coração Selvagem", lembrassem de mim. E, com essa lembrança, lhes ocorresse um pensamento:

     - "Puxa, essa música é a cara do Elias!"

     Creio que assim seria se eu fosse menos angustiado, se eu tivesse menos medo de errar nas escolhas, se eu não me sentisse abatido com os desacertos... Assim seria se eu conseguisse me levantar com facilidade, dar um chute na insegurança, e ter ânimo para estar sempre recomeçando!

     Queria saber me desprender das certezas... Queria não ter medo de começar tudo de novo (com paixão), se preciso fosse.

Coração Selvagem
Belchior

Meu bem, guarde uma frase pra mim dentro da sua canção
Esconda um beijo pra mim
Sob as dobras do blusão
Eu quero um gole de cerveja
No seu copo, no seu colo e nesse bar

Meu bem, o meu lugar é onde você quer que ele seja
Não quero o que a cabeça pensa
Eu quero o que a alma deseja
Arco-íris, anjo rebelde
Eu quero o corpo, tenho pressa de viver

Mas quando você me amar
Me abrace e me beije bem devagar
Que é para eu ter tempo
Tempo de me apaixonar
Tempo para ouvir o rádio no carro
Tempo para a turma do outro bairro ver e saber que eu te amo

Meu bem, o mundo inteiro está naquela estrada ali em frente
Tome um refrigerante, coma um cachorro-quente
Sim, já é outra viagem
E o meu coração selvagem tem essa pressa de viver

Meu bem, mas quando a vida nos violentar
Pediremos ao bom Deus que nos ajude
Falaremos para a vida
Vida, pisa devagar, meu coração, cuidado, é frágil
Meu coração é como vidro, como um beijo de novela

Meu bem, talvez você possa compreender a minha solidão
O meu som, e a minha fúria e essa pressa de viver
E esse jeito de deixar sempre de lado a certeza
E arriscar tudo de novo com paixão
Andar caminho errado pela simples alegria de ser

Meu bem, vem viver comigo, vem correr perigo, vem morrer comigo
Meu bem, meu bem, meu bem

Talvez eu morra jovem, alguma curva no caminho
Algum punhal de amor traído completará o meu destino

Meu bem, vem viver comigo, vem correr perigo, vem morrer comigo
Meu bem, meu bem, meu bem

Meu bem, meu bem, meu bem
Que outros cantores chamam baby
Que outros cantores chamam baby
Que outros cantores chamam baby


     Mas acontece que não sou assim; nunca fui assim. E se nesses meus 60 anos não consegui ser nada do que "Coração Selvagem" propõe, como posso querer me imaginar "descolado", arriscado e inconsequente? Quando vou conseguir seguir adiante, por qualquer caminho que se puser à minha frente, sem sentir preocupação pela consequência das escolhas?

     Bom... para alterar esse meu jeito preocupado de ser, acho que vou precisar de mais uns sessenta anos - pelo menos. Mas não desisto: vou me esforçar pra chegar aos cento e vinte - de preferência com todos os meus amigos e familiares por perto, para que possam ver que consegui me tornar um pouco mais leve.

quarta-feira, 18 de julho de 2018

VOU-ME EMBORA PRA ALBERTA


A imagem pode conter: céu, árvore, nuvem, atividades ao ar livre e natureza
"Banff National Park"- Alberta, Canadá
Foto: Fernando Roselino, postada no Facebook


"Guess I'll go out to Alberta
Weather's good there in the fall"
(Ian Tyson)


     Acordei hoje de manhã e, antes mesmo de tomar meu café, entrei no universo das redes sociais. Uma foto postada pelo meu amigo Roselino, no "facebook", atraiu minha atenção. 


CLIQUE NA SETA PARA OUVIR
Neil Young - "Four Strong Winds" (Ian Tyson)
https://www.youtube.com/watch?v=DP9UjLeLN5A

     Na foto, em primeiro plano, um céu azul, ornado com nuvens brancas, cobria um bosque de árvores altas; ao fundo, montanhas esbranquiçados pela neve surgiam, feito um céu estendido sobre o solo: era a imagem típica de uma, das muitas áreas de preservação ambiental espalhadas pelos países do norte. Fiquei olhando aquela imagem, com a sensação de que já havia estado naquele lugar: as trilhas por entre as árvores, o curso das águas, o ambiente gelado e silencioso...


A imagem pode conter: céu, montanha, atividades ao ar livre, natureza e água
"Banff National Park" - Alberta, Canadá
Foto: Fernando Roselino, postada no facebook

     Mas... Um momento, meu raro leitor: eu vos peço desculpas pelas bobagens acima descritas! Eu nunca me meti a caminhar por nenhum bosque, muito menos com montanhas cobertas de neve.

     Contudo, ao ver que a foto havia sido tirada pelo meu amigo Roselino, no Parque Nacional Banff, na província de Alberta, no Canadá, entendi como fui parar dentro dela (da foto). Alberta é uma das dez províncias do Canadá*. Por muitos anos ouvi o Neil Young** cantar, em "Four Strong Winds"***, que os bons tempos haviam passado, e que, por tal motivo, ele pensava em ir embora para Alberta - onde o clima é bom no outono, e onde ele possui muitos amigos para ajudá-lo.


Um mapa clicável do Canadá exibindo suas dez províncias, três territórios e suas respectivas capitais.
Alberta - localização no mapa do Canadá (10 Províncias, 3 Territórios)
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Subdivisões_do_Canadá


     Como nunca fui amigo de rei algum, não poderia pensar em realizar minhas buscas em Pasárgada - para onde o nosso poeta, Manuel Bandeira, um dia quis ir****. Foi assim que, sempre que eu ouvia o Neil Young, nos meus muitos anos de desencontros profissionais, eu me lembrava de Alberta (onde nunca estive ou havia estado), e pensava em dar uma escapada até lá: afinal, dizia o Neil Young, lá o clima era bom, no outono, e lá era possível encontrar amigos que poderiam ajudar (e nem precisavam ser reis). Se ele, o Neil Young, em tempos difíceis, poderia encontrar amigos em Alberta para ajudá-lo, eu também poderia: e por que não? Alberta sempre me pareceu, em virtude da música, uma região onde todos estão dispostos a estender braços de ajuda e amizade, para quem quer que seja.

     Resultado: os anos se passaram, as minhas buscas não terminaram, e eu continuo me vendo em Alberta toda vez que ouço "Four Strong Winds" - ou toda vez que "a barra pesa" por aqui.


Four Strong Winds

Four strong winds that blow lonely, seven seas that run high,
All those things that don't change, come what may.
Now our good times are all gone, and I'm bound for moving on,
I'll look for you if I'm ever back this way.

Guess I'll go out to Alberta, weather's good there in the fall.
Got some friends that I can go to working for.
Still, I wish you'd change your mind, if I asked you one more time.
But we've been through that a hundred times or more.

Four strong winds that blow lonely, seven seas that run high,
all those things that don't change, come what may.
Now our good times are all gone, and I'm bound for moving on,
I'll look for you if I'm ever back this way.

If I get there before the snow flies, and if things are going good,
you could meet me if I sent you down the fare.
But by then it would be winter, nothing much for you to do,
and the wind sure blows cold way out there.

Four strong winds that blow lonely, seven seas that run high,
all those things that don't change, come what may.
Now our good times are all gone, and I'm bound for moving on,
I'll look for you if I'm ever back this way.
Yes, our good times are all gone, and I'm bound for moving on,
I'll look for you if I'm ever back this way.
Quatro Ventos Fortes

Quatro ventos fortes que sopram solitários, sete mares que correm alto
Todas essas coisas que não mudam, aconteça o que acontecer
Agora nossos bons tempos se foram, e eu estou fadado a seguir em frente
Eu vou procurar por você se eu voltar desse jeito

Acho que vou para Alberta, o tempo é bom lá no outono
Tenho alguns amigos para os quais eu posso trabalhar
Ainda assim, eu gostaria que você mudasse de ideia, se eu lhe perguntasse mais uma vez
Mas nós já passamos por isso cem vezes ou mais

Quatro ventos fortes que sopram solitários, sete mares que correm alto
Todas essas coisas que não mudam, aconteça o que acontecer
Agora nossos bons tempos se foram, e eu estou fadado a seguir em frente
Eu vou procurar por você se eu voltar desse jeito

Se eu chegar lá antes que a neve voe, e se as coisas estiverem indo bem
Você poderia me encontrar se eu te mandasse a passagem
Mas então seria inverno, não há muito para você fazer
E o vento sopra frio lá fora

Quatro ventos fortes que sopram solitários, sete mares que correm alto
Todas essas coisas que não mudam, aconteça o que acontecer
Agora nossos bons tempos se foram, e eu estou fadado a seguir em frente
Eu vou procurar por você se eu voltar desse jeito
Sim, nossos bons momentos se foram, e estou decidido a seguir em frente
Eu vou procurar por você se eu voltar desse jeito


________________________
*As 10 Províncias do Canadá são: Colúmbia Britânica; Alberta; Saskatchevan; Manitoba; Ontário; Quebec; New Brunswick; Nova Escócia; Ilha do Príncipe Eduardo; Terra Nova e Labrador. (Os 3 Territórios são: Yukon, Territórios do Noroeste; Nunavut
**Neil Young (1945) cantor e compositor canadense; fez carreira nos Estados Unidos.
***"Four Strong Winds" (quatro ventos fortes), composta pelo cantor e compositor canadense Ian Tyson. Foi gravada por Neil Young no álbum "Comes a time" (Reprise records, 1978)
****"Vou-me embora pra Pasárgada" - poema de Manuel Bandeira, publicado em 1930 no livro "Libertinagem".