quarta-feira, 9 de março de 2011

ALGUÉM CANTANDO

(Foto: Piscina do clube, com varanda e salão ao fundo - foto de 1973, recuperada com alguns defeitos)



"Sempre achei que quem viveu no interior está mais aparelhado para ver direito o Brasil. Nas cidades pequenas é que aprendemos a sentir de perto o vizinho, o pobre, o rico, o roceiro, o safado, o honesto, o desinteressado, o aproveitador, porque todos estão ao alcance do olhar e da informação, no ombro a ombro de cada dia."
(Antônio Cândido, no prefácio de "O Menino de São Benedito" - livro de crônicas de Luis Nassif, editora SENAC)


     Inevitavelmente, nesses dias de carnaval, somos remetidos a carnavais de outros tempos. Carnaval de cidade pequena, de bailes no clube... Revendo esses carnavais, revejo também o salão, a disposição das mesas, os lustres, as máscaras coladas nas paredes, e em especial o palco do clube da minha cidade. E ao rever tudo isso, revejo também o Paulinho, um amigo muito querido (já falecido), que vivia falando de música, de acordes e instrumentos musicais. Fomos amigos e colegas de sala numa fase especial em uma escola técnica; isso nos primeiros anos da década de 70. O Paulinho, que apaixonadamente namorava a Cleuza, era componente de uma banda que abrilhantava bailes e festas. O estilo da banda era de música pop e ritmos dançantes para as últimas seleções da madrugada. Com frequência a banda fazia bailes em Guará. Era bom, aos sábados, ir ao clube, jogar pinque-pongue, e ficar ouvindo através das portas fechadas, no início da tarde, o “conjunto” (a banda) ajustar o som em preparação para o baile da noite.

(Os Mongóis: "uma banda que abrilhantava os bailes" - foto: postada no facebook por Cleuza M. Teixeira)
 
     Uma vez, tendo o grupo já terminado seu ensaio, cheguei no clube e ouvi a voz do Paulinho pelas caixas de som, cantando sozinho, acompanhando-se ao violão. Estranhei bastante aquela mudança, pois a música não fazia parte do repertório do grupo. Forcei um pouco a porta de entrada e, pela fresta, não vi ninguém no salão; no palco, sozinho, em um banquinho, somente ele com o violão nos braços. Fiquei olhando seu jeito de tocar e cantar, e percebi seu rosto voltado para o lado da piscina do clube. Ele parecia querer transpor a porta por intermédio de sua voz, transmitir uma mensagem e ao mesmo tempo captar, em quem ouvia, a emoção que aquela mensagem transmitia. Pensando nisso, olhando alternadamente e simultaneamente em direção ao palco e à piscina, notei poucas pessoas por ali. Mas a presença da Cleuza, namorada dele, deitada sozinha na beira da piscina, com o rosto voltado para o lado do salão de onde vinha o som, chamou-me à atenção. Eles pareciam estar se comunicando por intermédio da música. Aquele namoro à distância, por som de caixas acústicas, sem olhares, era pura poesia. Sem ser percebido, ouvindo o Paulinho cantar, fiquei olhando para um e para outro, ele no palco, ela na piscina, e pensando no que poderiam estar pensando, e no que o destino reservava para eles...
     Desde então, sempre me lembro do Paulinho e da Cleuza quando ouço a música que o Paulinho cantou naquela tarde: "Você é linda", do Roberto Carlos. 

(Clique e ouça a música)
Roberto Carlos - "Você é linda" (Roberto/Erasmo) - 1972
https://www.youtube.com/watch?v=BBTNcM2FIN4

     Pouco tempo depois, estavam casados. 


(Casamento - Paulinho e Cleuza - foto postada no facebook por Cleuza M. Teixeira)


 (Paulinho e Cleuza com a filha - foto postada no facebook por Cleuza M. Teixeira)

     Eis a letra.
VOCÊ É LINDA
(Roberto e Erasmo Carlos)

Você veio sorrindo não sei bem de onde
Um jeito tão puro de quem no futuro espera
O sorriso de alguém
Seu vestido sem curvas seu sonho guardando
Eu fico pensando no dia em que o sonho vier
Sua vida enfeitar
Não sei quem você é nem de onde você vem
Só sei que você é tão linda esperando neném
Esperando neném
Espero que tenha sido com muito amor
E seja quem for há de achar também você tão linda
Esperando neném
Seus desejos serão todos satisfeitos
Importante é que você saiba esperar
Sua voz ensaia a canção que um dia
Muitas vezes com ternura vai cantar
Você vive pensando que nome vai ter
O amor que do seu
Próprio amor vai nascer
E esse amor você nos braços vai ter
Não sei quem você é, nem de onde você vem
Só sei que você é tão linda esperando neném
Esperando neném
Espero que tenha sido com muito amor
E seja quem for há de achar também você tão linda
Esperando neném
Não sei quem você é, nem de onde você vem
Só sei que você é tão linda esperando neném
Esperando neném
Espero que tenha sido com muito amor
E seja quem for há de achar também você tão linda
Esperando neném
Tão linda
Esperando neném
Gordinha
Tão linda, tão linda
Esperando neném

RP, 07MARÇO2011

5 comentários:

  1. Eles viveram uma linda história de amor!!!
    O Clube mostra como somos reféns de nossas lembranças,e como passado e presente estão em aberto, por isto ficamos marcados pelo que nós vivemos e vivenciamos!!! Grata pela recordação!!! Beijos

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  2. Fenomenal alcançar tamanha espiritualidade na vida tão rápida e tão cheia de estrelismo, como se fosse fardado e conhecido futuro que teria meu irmão. Sem dúvida Elias, vc conseguiu em poucas palavras resumir a vida. do Paulinho com muita habilidade tirada sei lá de onde. Parabéns e obrigado pela homenagem.

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  3. Fenomenal alcançar tamanha espiritualidade na vida tão rápida e tão cheia de estrelismo, como se fosse fardado e conhecido futuro que teria meu irmão. Sem dúvida Elias, vc conseguiu em poucas palavras resumir a vida. do Paulinho com muita habilidade tirada sei lá de onde. Parabéns e obrigado pela homenagem.

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  4. Fenomenal alcançar tamanha espiritualidade na vida tão rápida e tão cheia de estrelismo, como se fosse fardado e conhecido futuro que teria meu irmão. Sem dúvida Elias, vc conseguiu em poucas palavras resumir a vida. do Paulinho com muita habilidade tirada sei lá de onde. Parabéns e obrigado pela homenagem.

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    Respostas
    1. Obrigado Zezinho... visite sempre o blog. Há muitas coisas de Guará nele postadas. Grande abraço.

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