sexta-feira, 26 de outubro de 2012

A VAGA OPINIÃO PESSOAL EM MATÉRIA DE JORNAL



("Claude Monet reading" - Pierre-Auguste Renoir, 1872 - fonte: elarpamagica.blogspot.com)


Qualquer fato, pessoa ou coisa relativa à minha terra natal me atrai a atenção. Chego a ponto de, eventualmente, seguir qualquer automóvel com placa de Guará que passe por mim no trânsito, na expectativa de identificar o motorista para poder ao menos saudá-lo com um aceno de mão. É bem verdade que, a cada dia, diminui o número de conhecidos meus que vivem lá. Mas como sabem que sou assim, que gosto de acompanhar os acontecimentos mais importantes da cidade, enviaram-me para que eu lesse a edição de 13 de outubro do jornal “A Voz”.

O jornal “A Voz” é semanal e circula por muitas cidades. Com sedes regionais em Ribeirão Preto, São Joaquim da Barra e Franca, noticia os fatos ocorrentes nestas sedes e nas cidades situadas em torno delas. Já existe há 22 anos e está muito bem feito. Por isso, parabenizo seus editores e todos aqueles que dão vida a ele.

Mas, como leitor, e com o melhor dos propósitos, tomo a liberdade de fazer aqui uma pequena observação construtiva na direção do que entendo ser bom jornalismo. 

Ao ler a edição de número 1600 que me foi enviada, vi em sua primeira página as fotos de alguns prefeitos que foram eleitos na região – inclusive o de Guará. E foi com grande contentamento que li o subtítulo da manchete:

“Neste especial, Jornal A voz mostra os vencedores para prefeito e vereador nos principais municípios da região”. 

A razão desse meu contentamento foi porque, se a foto do prefeito eleito de Guará está ali, significa que Guará é um dos principais municípios da região! E, claro, essa simples consideração, para um filho seu, já é motivo de alegria. Fiquei orgulhoso!

No entanto, procurando no jornal por mais notícias de Guará, li na página A5 um pequeno texto que não me agradou. Não me agradou porque deixou de lado a imparcialidade e trouxe um juízo de valor; julgou. Nele (no texto) foi dito que o prefeito eleito poderia ter vencido mais facilmente (a eleição) se não tivesse vinculado seu nome ao prefeito cujo mandato está prestes a findar-se. Continuou o texto dizendo que este está envolto em escândalos de desvio de recursos e licitações fraudulentas. E conclui a matéria julgando, dizendo que, se o prefeito eleito fizer sua administração sem interferência do atual - a quem a matéria qualificou de “péssimo” - tem tudo para se sair bem.

Foi muito imprópria a utilização desse adjetivo (“péssimo”) para qualificar o atual prefeito. Seu emprego, a meu ver, feriu o texto e, consequentemente, colocou em estado de suspeição a matéria. Quero deixar claro que minhas considerações aqui não são no sentido de defender ou acusar quem quer que seja: nem o prefeito e tampouco o autor da matéria – aliás, nem sou eleitor em Guará. Mas penso na grandeza do jornalismo regional, na sua importância para fornecer elementos que se tornarão fonte de produção da História. 

Ao ler (na matéria) o qualificativo “péssimo”, percebi existir ali um julgamento, uma opinião muito pessoal com evidente distanciamento da isenção necessária para o bom jornalismo, para o jornalismo de qualidade. É do próprio conceito de jornalismo o entendimento de que, ao jornalista, cabe noticiar o fato com isenção, imparcialidade, correção e agilidade. Quanto às conclusões, somente ao leitor cabe tirá-las. De outra forma o que se produz no jornal é propaganda, é tentativa de convencimento, é tentativa de atrair adeptos subestimando e desrespeitando a capacidade do leitor formular sua própria análise crítica a respeito do que lê. 

 (fonte: bigstockphoto.com)

Claro que existe o jornalismo opinativo. Contudo, no texto comentado, "onde estão as razões que sustentariam uma opinião e que convenceriam um leitor a respeito de ter sido um prefeito bom, ruim ou péssimo?" Na matéria, simplesmente dizer que o atual prefeito está envolto em escândalos de desvios de recursos e licitações fraudulentas não elucida nada. Fico me perguntando e ansioso por saber, posto que a informação é vaga: "onde houve desvio de recursos? em quais licitações houve fraude? Tudo isso já foi comprovado?" Pois é, fica faltando...

Praticar jornalismo é ter como propósito central produzir conhecimento, informar, inspirar raciocínio crítico no leitor. Sem isenção a informação fica tendenciosa, viciada, perde qualidade. Por isso, na qualidade de leitor, mais uma vez parabenizando o Jornal pelos seus 22 anos e desejando a ele muitos anos de existência, peço que considerem  a nossa capacidade ("nossa", dos leitores), em suas matérias, de formularmos nossas próprias opiniões a respeito do que for noticiado. E que, nas edições futuras, eu e todos os leitores possamos ler matérias claras e convincentes, com a prevalência da isenção ao invés da vaga opinião pessoal.


RP, 26out12


quarta-feira, 24 de outubro de 2012

MINHA VISITA CASUAL AO ESTÁDIO DO MORUMBI





 (Eu, em visita ao "Morumbi" - arq. pessoal, 12out12)

     Tudo bem, eu concordo que a fase não é das melhores. Prá ser franco, é das piores! Vergonhosa! Mas, não sei por que, o time da gente é coisa sagrada – a gente resiste, insiste, mantém sempre uma esperança, nunca abandona. 

     Lembro-me com saudade do meu time nos anos 60: Valdir, Djalma Santos, Djalma Dias e Ferrari; Zequinha e Tarciso; Gildo, Vavá, Servílio, Ademir da Guia e Rinaldo. – “Que timaço!” 

     Nesse tempo, minha primeira década de vida, eu tinha todos os grandes times em jogo de botão - e sofria muito com futebol. Nesse tempo o Palmeiras andava bem! Era muito diferente dessa porcaria de hoje. Mas esse tempo, “puts”, já vai longe... 

     Nesse tempo eu visitava todos os domingos o meu tio Norival – torcedor fervoroso do São Paulo. Em geral eu o encontrava deitado no sofá da sala de entrada, fumando e ouvindo no rádio os comentários esportivos. Com a minha chegada ele me contava qual seria a escalação dos times que iriam jogar – e me dava a escalação do São Paulo e a do Palmeiras, mesmo que fossem outros os times que jogariam de fato. Escalados (os times), eu me sentava no chão para ouvi-lo imitar o Fiori Gigliotti (1) narrando o jogo. E ele caprichava nas frases celebrizadas pelo Fiori:  

(Meu tio Norival - arq. pessoal)


     - “Abrem-se as cortinas e comeeeeça o espetáculo!” - no início do jogo. 

     - “O teeeempo paaaassa!” – nos momentos mais angustiantes da partida, quando algum time precisava fazer um gol. 

   - "Goooooolllll.....Duduuuuu, o mooooço que veio de Araraquara!” – em algum gol do Palmeiras, marcado pelo Dudu (2). 

     - “Agora não adiaaaanta chorar!” – logo após narrar um gol.

 (Fiori Gigliotti narrando um gol do Palmeiras)
CLIQUE NA SETA PARA ASSISTIR
  

     Nessas transmissões do meu tio o Palmeiras nunca perdia. Na pior das hipóteses, se estivesse perdendo, para que eu não ficasse triste, ele sempre arrumava, no último minuto, um gol de pênalti do Ademir da Guia (3) para empatar o jogo. 

     Foi por isso que esse tempo que passou, ficou. 

     Eis então que, transitando pelo bairro do Morumbi, passei pelo estádio do São Paulo (o “Cícero Pompeu de Toledo”, conhecido como “Morumbi”) e resolvi descer do táxi. Caminhei em direção ao portão de entrada e, encontrando-o aberto, entrei. Queria conhecer as arquibancadas, ver o gramado onde ocorreram tantas partidas que ouvi sendo transmitidas tanto pelo rádio quanto pelo meu tio.

 (Entrada principal do Estádio do Morumbi - arq. pessoal)


     Entrei em um restaurante dentro do estádio, que fica nas arquibancadas atrás do gol do lado do Portão 2, e sentei-me em uma cadeira para ficar olhando. 

 (Estádio do Morumbi - vista interna - arq. pessoal)

 (Estádio do Morumbi - vista interna - arq. pessoal)


   Que belo estádio! Todo ajardinado, limpinho... Uma garçonete perguntou-me se eu iria almoçar. Respondi que sim, que me trouxesse o cardápio... e continuei olhando o estádio... o gramado verde, verdinho... 


 (Estádio do Morumbi - vista interna a partir do restaurante na arquibancada - arq. pessoal)

     Mas a moça demorou muito, tanto, mas tanto, que tive tempo de retomar minha lucidez. Foi assim que, por estar em “território adversário”, meu coração alviverde falou mais alto. E eu, incomodado por estar ali, levantei-me num movimento brusco e fui embora assobiando o hino do Palmeiras, sem que a garçonete que se aproximava pudesse entender o turbilhão de pensamentos que me estavam ocorrendo...



(1) FIORI GIGLIOTTI (1928-2006) – radialista e locutor esportivo
(2) DUDU – apelido de Olegário Tolói de Oliveira, nascido em Araraquara, SP, volante do Palmeiras na época da “Academia de Futebol”
(3) ADEMIR DA GUIA – carioca, marcou história no Palmeiras. Considerado pela crítica como um dos melhores jogadores do futebol brasileiro de todos os tempos. Foi apelidado de “Divino”, pela classe com que jogava.




quarta-feira, 17 de outubro de 2012

O PALÁCIO DOS BANDEIRANTES




("Palácio dos Bandeirantes" - arq. pessoal, 12out12)


Gosto de visitar museus e centros de decisão e poder. Em geral estão instalados em prédios suntuosos cujas histórias ficam esperando para serem conhecidas. Sedes de Governo, residências oficiais de governantes, ministérios e secretarias, tudo, de preferência bem antigo, evoca fatos passados impregnados em suas paredes, varandas, jardins e corredores: adoro isso. 

Foi assim que, em viagem a São Paulo no último feriado, dediquei boa parte de uma tarde para visitar, no Morumbi, o Palácio dos Bandeirantes: a sede do governo do Estado. 


(Palácio dos Bandeirantes: fachada - arq. pessoal, 12out12)


De início o motorista de táxi, tomando conhecimento do meu destino, e não resistindo à oportunidade de “brincar”, sugeriu uma certa intimidade (não sei se minha ou dele) com o governador:

        - Vai bater um papinho com o Geraldo (1)? 

E lá fui eu, com o cotovelo apoiado na janela do carro, atento a tudo. O bairro do Morumbi, depois do Rio Pinheiros, abriu-se em árvores – uma pequena floresta urbanizada “em sobe e desce” de morros e mansões inavistáveis pela dimensão de seus muros: um charme detectável pela suntuosidade de seus portões e luminárias, posto que pelas suas ruas não se vê sequer um pedestre ou estabelecimento comercial para se fazer qualquer avaliação!

Identifiquei-me uma vez na guarita do Palácio, uma segunda vez na porta de entrada do prédio, e iniciei a visita. Quanto silêncio! É certo que era feriado, mas, além de mim e do meu guia, não havia ninguém mais ali dentro. Achei isso muito bom – pois assim poderia estabelecer uma cumplicidade maior com os móveis, os fatos históricos, as obras de arte e os personagens expostos nos quadros das paredes.

(Palácio dos Bandeirantes: salão nobre e mezanino - arq. pessoal, 12out12)

As partes abertas à visitação são apenas o hall do salão nobre e o mezanino. No hall nobre estão expostas obras de artistas renomados onde pude ver, dentre outras, o enorme painel “Criação, Expansão e Desenvolvimento do Brasil”, de Antônio Henrique do Amaral, e “Semeaduras”, de Clóvis Graciano. Além de painéis, quadros, esculturas e outras obras de arte, troféus e mimos ofertados aos representantes do governo do Estado ornam os corredores do Palácio.

(Palácio dos Bandeirantes, salão nobre: "Criação, expansão e desenvolvimento do Brasil" - Antônio Henrique do Amaral - arq. pessoal, 12out12)

(Pal. Bandeirantes: corredor interno ornado com esculturas - arq. pessoal)



O acesso ao mezanino é feito por duas escadas que ficam à esquerda e à direita de um auditório - o Auditório Ulisses Guimarães. Em suas paredes estão expostos, sequencialmente, os quadros com as pinturas das figuras dos governadores do Estado ao longo do tempo. É claro que a figura de um governador de Estado deve parecer sóbria. No entanto, chamou-me a atenção o quão escuros e sombrios foram pintados.

(Pal. Bandeirantes: Escadaria de acesso ao mezanino - Governadores do Estado - arq. pessoal, 12out12)

No mezanino, o espaço é reservado para exposições circunstanciais. Estavam expostos ali os “cusquenhos” - telas do período barroco andino pertencentes ao acervo dos Palácios (Bandeirantes e Boa Vista) do governo do Estado.

  (Pal. Bandeirantes: "São Lucas Evangelista" - escola cusquenha, séc. XVIII - óleo sobre tela - acervo artístico-cultural dos Palácios - fonte saopaulo.sp.gov.br)

Mas a área externa do Palácio foi também, para mim, um atrativo à parte. Suas árvores, suas esculturas, a presença de aves, tudo isso deu ao Palácio um ar de cidade pequena e juventude revisitada. Isso porque, olhando o Palácio pelo lado de fora, revi na lembrança livros e figuras do meu tempo de colégio onde ele era retratado – quando então nem imaginava que um dia, em uma tarde qualquer, iria visitá-lo pessoalmente.  


(Pal. Bandeirantes: vista externa, a partir da porta principal - arq. pessoal)

Depois de uma hora de visita tomei um táxi que me levou a uma confeitaria. Ali me sentei a uma mesa e pedi uma xícara de café bem forte com um pastel de Santa Clara. E da mesa, olhando o escoar da água do chuvisqueiro pela sarjeta, fiquei pensando em coisas que, de tão insignificantes, já nem me lembro mais...

(1) referência ao Governador do Estado de SP, Geraldo Alckimin)

RP, 16out12

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 (e as Constituições brasileiras anteriores)



(Promulgação da Constituição Federal/88 no plenário da Câmara dos Deputados - Brasília/DF)

                                                       

                                        (Visita ao Plenário da Câmara dos Deputados - Brasília, DF, abril/12)


                                                     "Fazer política é (...) enobrecer a memória do nosso tempo"
                                                                                    (Afonso Arinos)


Hoje, dia 05 de outubro, nossa Constituição Federal está completando 24 anos desde a sua promulgação. Ela foi e tem sido o retrato e a consequência de nossas transformações: é uma Constituição escrita, formal, dogmática, rígida e, principalmente, promulgada (democrática) – fruto de uma Assembleia Nacional Constituinte. Mas não foi a única Constituição brasileira. Antes dela tivemos outras sete. 

Depois da Independência em 1822 precisamos nos organizar, definir quem éramos, como nos estruturávamos, como o poder era adquirido e exercido aqui no Brasil. Assim a primeira Constituição brasileira, a Constituição Imperial, foi promulgada por D. Pedro I em 1824.

Com a proclamação da República, em 1889, o Brasil precisou se reorganizar. Portanto, os dispositivos da Constituição de 1824, elaborada para regrar um Império, já não serviam para uma República. Em decorrência disso, em 1891, uma nova Constituição foi promulgada – a primeira Constituição da era republicana. 

Com o golpe de Estado em 1930, Getúlio Vargas comprometeu-se a convocar uma Assembleia Nacional Constituinte e promulgar uma nova Constituição para o Brasil – o que veio a ocorrer em 1934, depois do Estado de São Paulo ter lutado, em 1932, para que isso acontecesse. Essa Constituição durou pouco.

Com o movimento de autoritarismo e centralização de poder ocorrendo no mundo, Getúlio Vargas, seguindo essa tendência, outorgou (impôs) uma nova Constituição no ano de 1937 (a chamada “Constituição do Estado Novo”). 
Essa Constituição também não foi muito longe: durou até o final da Segunda Guerra Mundial quando, devido ao processo de redemocratização posterior ao primeiro período de Getúlio Vargas, uma nova Constituição foi promulgada: a Constituição de 1946.

Mas o Brasil passou por transformações e influências que ensejaram o golpe militar de 1964. Nessa linha de autoritarismo, a Constituição de 1967 foi promulgada por um Congresso Nacional mutilado por cassações. Em 1969 essa Constituição foi tão amplamente reformada, que muitos a consideram como sendo uma outra Constituição.

Em um momento de abertura política e redemocratização do país o povo brasileiro “falou alto” exigindo eleições diretas para Presidente da República (“Diretas Já” – 1984). Findo o período militar o Congresso Nacional assumiu poderes de Assembleia Constituinte, e promulgou a Constituição Federal de 1988 – a chamada “Constituição Cidadã”. 

Ela é, portanto, a nossa oitava Constituição, se considerarmos também como uma Constituição a reforma de 1969 – ou a sétima, sem que isso seja considerado. Já Emendada setenta vezes desde a sua promulgação, tendo seus próprios mecanismos para acompanhar e adequar-se às mudanças que ocorrem na sociedade, ela vem traçando o perfil do nosso país, organizando nossas instituições, delimitando o poder e disciplinando sua forma de aquisição e exercício.

 (Congresso Nacional - Brasília, DF - abril/12)