sexta-feira, 16 de maio de 2025

AMOR DE MÃE

 

"Maternidade" - Juan Rocasalbas (1985) - acervo pessoal

    Do final dos anos 60 até meados dos anos 80, Rosa Freire d'Aguiar residiu e trabalhou na França como jornalista e correspondente das revistas Isto É e Manchete. Durante os anos lá vividos, traduziu a conjuntura internacional e entrevistou escritores, intelectuais e artistas de destaque, dentre as quais Ernesto Sabato, Fernand Braudel, François Perroux, Georges Simenon, Julio Cortázar e Norma Bengell. Anos depois desse período, desencaixotou algumas entrevistas que havia guardado, e as publicou em livro - ao qual deu o título de "Sempre Paris" (Companhia das Letras, 2023).

"Sempre Paris" - capa do livro -
https://www.companhiadasletras.com.br/livro/9788535935516/sempre-paris-vencedor-jabuti-2024

    Ao iniciar a leitura de "Sempre Paris", justamente no último "dia das mães" (11 de maio), deparei-me em suas páginas com a entrevista que lhe fora concedida pela filósofa francesa Élisabeth Badinter, autora de um best seller,  em 1980, na França, e que inspirava uma discussão a respeito do mito do amor materno - "L'amour en plus" (1980), traduzido no Brasil com o título "Um amor conquistado - o mito do amor materno".
    Para mim sempre esteve pacífico o entendimento de que "amor de mãe é o mais sublime, é o mais "puro e sincero, 'inocente como a flor'", é diferenciado, é o que advém da "extração" de uma parte daquela que gerou e que é dedicado aquele/a que nasceu - ou seja, é o amor que está além de todos e quaisquer outros tipos ou maneiras de amar.
    Admito, contudo, que eu nunca havia pensado a respeito do assunto.
    A autora de "L'amour en plus", não negando o instinto maternal, contestava a ideia de que esse amor de mãe seria inato e idêntico em todas as mulheres. Em seu entendimento, "o amor materno é um aprendizado que uma mãe vai tricotando no contato diário com o filho" - mas "pode não surgir", disse ela na entrevista. Um dos pontos abordados na conversa com a jornalista considerava a possibilidade da troca involuntária de um bebê ao nascer, ainda no hospital, e a suposta mãe passar a tratar o bebê a ela apresentado como seu filho natural, direcionando a ele, a esse filho trocado, todo o seu "amor de mãe".
    Pois foi justamente pensando nisso que me veio o questionamento a respeito da possibilidade do amor de mãe poder não ser inato, mas naturalmente desenvolvido e construído. Diante de tal hipótese, pareceu-me, então, que "amor construído" pode não se diferenciar de qualquer outro amor que se dedica a alguém - ou seja, o amor que se tem por alguém pode ser tão forte quanto o amor que uma mãe tenha por um filho.
    Conversei com seis mulheres a respeito da possibilidade da troca de filho desde o primeiro contato visual entre mãe e "filho" em um hospital, após o nascimento. Surpreendeu-me constatar que, para todas elas, a ideia do amor construído era pacífica - ou seja, tal entendimento superava a ideia do amor inato. E fui adiante nas minhas indagações. Todas elas mantiveram o entendimento de que o amor de pai pelo filho pode ser tão forte, ou igualmente construído, quanto o amor de uma mãe pelo filho que assumiu como sendo seu.
    Se formos levar em consideração muitas das notícias que nos chegam, e que tratam da relação mãe/filho, é espantoso ver que há casos de agressão, violência, maus-tratos e negligência materna. E em assim sendo, o que poderia justificar isso? Desequilíbrio mental? Pobreza? Egoísmo? Amor "não desenvolvido"? Nesses casos, onde se situaria o "amor materno"? Não sei... Quando me dedico a pensar nessa e em tantas outras questões que envolvem a natureza humana, sinto-me dominado por um elevado grau de aflição diante da minha ignorância em relação a temas tão sensíveis.


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