domingo, 20 de julho de 2025

IMPERIALISMO: NADA MAIS ME SURPREENDE


Foto que está circulando no facebook - (Fonte desconhecida)


Para a Vanda,
minha amiga.


    Veio do litoral paulista, enviado pela minha amiga Vanda, um presente em forma de inspiração. Tal presente, originário da Costa do Marfim, na África, chegou a ela pelo Oceano Atlântico. Impelido pela lembrança de antigas caravelas dominadoras, e navios negreiros de triste memória, o presente passou por Itanhaém, Santos, São Vicente e São Paulo e, em forma de Reggae, veio bater à minha porta: "Plus rien ne m'etonne" (nada mais me espanta), gravado por Tiken Jah Fakouly.
    O presente, pela crítica e reflexão propostas, me fez bem. Ao ouvi-lo, instintivamente fui passear pelo litoral da África - Gana, Nigéria, Benin, Serra Leoa... -, adentrando o seu interior - Congo, Zâmbia, Chade...-, revisitando o projeto de dominação elaborado na Conferência realizada em Berlim nos anos de 1884 e 1885.
    Assim como na prepotência de Portugal e Espanha, ao decidirem pelo loteamento do mundo em 1494 (pelo Tratado de Tordesilhas), a cidade de Berlim sediou uma Conferência entre potências mundiais da segunda metade do século XIX, para que estas pudessem planejar a expansão de influências econômicas e dividir mercados e áreas para exploração de recursos naturais e escoamento de produtos manufaturados.
    A África era vista, à época, como um continente repleto de possibilidades. E como a competição pela exploração das riquezas naturais africanas, e a disputa pela conquista do mercado consumidor de produtos acabados poderia gerar tensões entre as potências europeias, o então chanceler do império alemão Otto von Bismarck convidou 14 países para se reunirem em Conferência: Alemanha, Áustria-Hungria, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França, Grã-Bretanha, Itália, Noruega, Países Baixos, Portugal, Rússia, Suécia e Império Otomano - além dos Estados Unidos. Assim, iniciada em novembro de 1884, a Conferência de Berlim terminou em fevereiro de 1885 com o fracionamento da África em regiões para exploração e ocupação europeia do continente.
    Para espanto geral, meu caro leitor, não houve nessa Conferência a participação de qualquer representante do continente africano. Estranho, não é? Onde já se viu? Discutem o que fazer do "meu" quintal, promovem a sua divisão, e nem sequer me convidam para debater sobre o assunto, sobre o que é meu? Esse fracionamento acabou acontecendo, portanto, sem o devido respeito aos perfis étnicos e culturais existentes no continente africano - ou seja, "esqueceram", especialmente, que havia gente habitando o continente... gente que, ao final, deixada de lado, saiu enfraquecida.
    Trazendo a Conferência de Berlim para os nossos dias, o que podemos perceber é que a história está se repetindo, porém em dimensões muito maiores: restrito a um continente, inicialmente (o africano), a fragmentação em áreas de influência tem por limite, agora, o planeta todo. Ou seja, não tem limite! Essa forma brutal de tentativa de dominação (leia-se "colonização", imposição do imperialismo) que vem se arrastando até os dias de hoje por todos os cantos do mundo causa o mesmo espanto que causou no final do século XIX: quem, hoje, vai explorar o mercado sul-americano? os Estados Unidos, a China, ou a União Europeia? quem vai gerenciar a exploração das riquezas do oriente médio? se um país não se alinhar a outros, esses outros, mais fortes, promoverão retaliações econômicas..... E mais: o desrespeito à soberania e a ingerência estrangeira em muitos países, hoje, são promovidos sob ameaças comerciais, que podem agravar desigualdades econômicas já existentes... E há, ainda, uma forte agravante: já não são mais 14 países; cada um é por si. 
    - "Muito estranho... muito estranho...
    "Nada mais me surpreende", o reggae-presente gravado pelo Marfinense, que me foi enviado pela Vanda, ilustra muito bem a questão:
    - "Se você apoiar o bombardeio ao qual submeto o meu vizinho, eu imponho baixas tarifas de importação aos produtos de seu país; se você propagar a ideia de que a moeda referência hoje pode deixar de sê-lo amanhã, eu não compro mais produtos originários de seu país; se você não for condescendente com o meu conceito de liberdade, eu não permito que os seus nacionais coloquem os pés no meu país...
    - E assim, meus amigos, assim (des)caminha a humanidade! E que se explodam os homens, as  mulheres e as crianças... as instituições, os hospitais, as escolas e a soberania dos mais fracos...
    Disseram-me até que estão até de olho no acarajé - posto que o mercado que a iguaria atinge, com a sua comercialização, pode diminuir a possibilidade de lucros dos sanduíches da rede McDonald's. 
    - "A Bahia que se cuide! Eu, hein?... Antes que seja tarde, vou lá no quintal, quietinho, colher da jabuticabeira alguns de seus frutos...

Uma jabuticabeira
https://meliponario-irmaosnocete.blogspot.com/2017/01/jabuticabeira.html

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Tiken Jah Fokoly - "Plus rien ne m'etonne" (Nada mais me surpreende)
https://www.youtube.com/watch?v=uQB04VsFusE&list=RDuQB04VsFusE&start_radio=1

Plus Rien Ne M'étonne

 

Ils ont partagé le monde

Plus rien ne m'étonne

Plus rien ne m'étonne

Plus rien ne m'étonne

 

Si tu me laisses la Tchétchénie

Moi je te laisse l'Arménie

Si tu me laisses l'Afghanistan

Moi je te laisse le Pakistan

 

Si tu ne quittes pas Haïti

Moi je t'embarque pour Bangui

Si tu m'aides à bombarder l'Irak

Moi je t'arrange le Kurdistan

 

Si tu me laisses l'uranium

Moi je te laisse l'aluminium

Si tu me laisses tes gisements

Moi je t'aide à chasser les Talibans

 

Si tu me donnes beaucoup de blé

Moi je fais la guerre à tes côtés

Si tu me laisses extraire ton or

Moi je t'aide à mettre le général dehors

 

Ils ont partagé Africa sans nous consulter

Ils s'étonnent que nous soyons désunis

Une partie de l'empire Mandingue se trouva chez les Wolofs

Une partie de l'empire Mossi se trouva dans le Ghana

Une partie de l'empire Soussou se trouva dans l'empire Mandingue

Une partie de l'empire Mandingue se trouva chez les Mossi

 

Ils ont partagé Africa sans nous consulter

Sans nous demander, aïe-aïe-aïe, sans nous aviser

 

Ils ont partagé le monde

Plus rien ne m'étonne

Plus rien ne m'étonne

Plus rien ne m'étonne

 

Nada Mais Me Surpreende

 

Dividiram o mundo

Nada mais me surpreende

Nada mais me surpreende

Nada mais me surpreende

 

Se você me deixar a Tchetchênia

Eu te deixo a Armênia

Se você me deixar o Afeganistão

Eu te deixo o Paquistão

 

Se você não sair do Haiti

Eu te mando direto pra Bangui

Se você me ajudar a bombardear o Iraque

Eu ajeito o Curdistão pra você

 

Se você me der o urânio

Eu te deixo o alumínio

Se você me der seus minérios

Eu te ajudo a caçar os Talibãs

 

Se você me pagar bem em trigo

Eu entro na guerra com você

Se você deixar eu pegar seu ouro

Eu te ajudo a derrubar o general de novo

 

Dividiram a África sem nos consultar

Depois se espantam que estamos desunidos

Uma parte do Império Mandinga foi parar com os Wolofs

Uma parte do Império Mossi foi parar em Gana

Uma parte do Império Sussu foi parar no Império Mandinga

Uma parte do Império Mandinga foi parar com os Mossi

 

Dividiram a África sem nos consultar

Sem nos avisar, ai-ai-ai, sem nos perguntar

 

Dividiram o mundo

Nada mais me surpreende

Nada mais me surpreende

Nada mais me surpreende

 


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