sábado, 28 de dezembro de 2013

APRENDENDO COM OS CÃES



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("Vida de Cachorro" - Os Mutantes)

- "Um copo de água filtrada ou fervida, uma pitada de sal, e duas pitadas de açúcar. É assim que se faz o soro caseiro" - ensinou-me o veterinário. 

- "Dê a ela seis mililitros a cada meia hora. Para facilitar, use uma seringa (obviamente sem a agulha). Segure o focinho e injete o líquido na lateral da boca da cachorrinha, por entre os dentes. Se ele resistir, chame alguém para ajudar a segurar a cabeça e as patas para conseguir forçá-la a tomar o soro" - orientou-me ele. "Evite dar comida e ela, e vamos observar", concluiu ele aplicando nela um antibiótico e comprometendo-se a retornar no dia seguinte para novamente examiná-la. 

Foi assim que eu e minha filha fomos orientados a tratar nossa cachorrinha - a "Neguinha". Ela, que por algumas semanas estava com uma infecção uterina - porém aparentemente bem -, havia ficado por três dias em um hotelzinho em função de nossa viagem de Natal. Quando voltou para casa, tendo passado o Natal sozinha, estava fraca, apática, sem forças para comer ou beber qualquer coisa. Voltou literalmente entregue.

Deixei a Neguinha sob os cuidados da minha filha e fui trabalhar. Voltei no começo da noite e recebi dela a notícia:

- "Pai, tentei o dia todo dar o soro. A Neguinha não aceitou. Ela resistiu, fechou a boca. Não tinha ninguém para me ajudar... Não consegui..." 

Vendo a Neguinha naquele estado tratei eu mesmo de tomar as devidas providências. Tinha que fazer com que ela aceitasse o soro até mesmo "na marra", se fosse preciso! 

Determinado, peguei a seringa, puxei o êmbolo, e coloquei ali seis mililitros de soro. Sentei-me no chão e arrastei-a para perto de mim. Segurei seu focinho, forcei, apertei, pressionei o embolo... e nada! Tentei várias vezes. Em vão. Ela resistia, chacoalhava a cabeça, e o soro espalhava-se pelo chão. 

Já sem saber como agir encostei-me desolado, na porta da cozinha, e fiquei olhando minha pobre cachorrinha inerte, espalhada pelo chão.

Depois passei a observá-la: ela baixava a cabeça e lambia, do piso, algumas gotas do soro que havia caído...

- "Ora", pensei, "se ela lambe o soro no piso, certamente vai querer tomá-lo voluntariamente se eu o colocar no seu pratinho".

E assim eu fiz. Despejei o soro dentro de seu pratinho e fiquei ali sentado. Ela veio devagarzinho, de mansinho, olhou para mim, e começou a beber o soro. Bebeu todos os mililitros que não havia bebido durante a tarde toda.

Depois disso acendeu-se. Energizou-se. Ficou ao meu lado quando cortei um pedaço de queijo e outro de salaminho. Ofereci a ela um pouquinho de tudo que eu comia, e ela não recusou nada... um pedaço disso... outro daquilo... e mais outro... e mais outro...

Abanou a cauda e foi ao seu pratinho de comida, como que a me pedir para alimentá-la melhor. Não resisti. Abri a geladeira, peguei várias colheradas generosas na carne moída, esquentei no forno de micro-ondas, e despejei tudo em seu prato. 

Nhoc! Comeu até o último pedacinho com a mesma voracidade de sempre!  Em seguida saiu dali. Levantei-me da cadeira onde estava e pus-me a segui-la. Ela dirigiu-se ao banheiro, e tentava entrar no box de banho. 

Pensei um pouquinho e logo entendi a mensagem. Não deu outra! Enchi sua vasilha de água e a coloquei no piso. Ela veio e encharcou-se toda, lambendo até a última gota.

E agora, para minha tranquilidade, está deitada aqui na sala de casa sob a minha cadeira, quietinha. Certamente aguardando que a digestão seja feita.


("Neguinha" - aguardando que a digestão seja feita)

Amanhã será um dia importante para ela, porque será examinada novamente pelo veterinário. Não sei o que lhe será prescrito: remoção cirúrgica do útero? Não sei... Só sei que mesmo na sua fraqueza ainda me ensinou mais essa: ninguém, nem mesmo os animais, gostam de ser forçados a nada... nem mesmo a tomar soro. As coisas acontecem naturalmente, de forma espontânea... e certamente no momento exato que devem acontecer...

("Neguinha")


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