terça-feira, 24 de maio de 2011

CANÇÃO PARA GUARÁ: UM HINO E SEUS SÍMBOLOS*


 (Praça Nove de Julho - Guará/SP - foto: arq. pessoal)


 "Quero encantar o coração da juventude
com a virtude que temos cá;
que é ter no peito um coração como lareira
da hospitaleira gente amada de Guará."
(Canção para Guará -trecho- Prof. Joaquim Martins)


     Sempre que penso em alguma cidade ou em algum país fico analisando seus valores, sua cultura, a história do seu povo e os feitos dos seus herois. Encontro uma maneira de procurar entender um pouco de cada povo ouvindo atentamente a letra de seus hinos. Por intermédio deles fico com a ideia de que posso conhecer também os valores das pessoas que os entoam, conseguindo assim relacionar as pessoas aos seus lugares de origem. Isso me possibilita, pelo menos teoricamente, tentar compreender muitos dos seus gestos e manifestações, tanto individuais quanto coletivos.

     Em especial nas ocasiões de disputas esportivas, a possibilidade de conhecermos um pouco de cada povo é estimulada quando seus respectivos hinos são executados. A gente fica ouvindo o hino na TV, olhando as expressões nos rostos de cada atleta, sua postura, as cores de seu uniforme... Tudo isso vai fazendo nascer na mente da gente o desenho de um lugar, dos seus habitantes, das coisas que são por eles valorizadas. E a letra do hino, queira ou não, vai traçando um perfil generalizado dos habitantes daquele lugar.

     Alguns países reverenciam seus monarcas. Assim, o hino do Reino Unido: “Deus salve nossa graciosa Rainha! Vida longa, nossa nobre Rainha! Deus salve nossa Rainha! Enviai-a vitoriosa, alegre e gloriosa, ao longo reinar sobre nós, Deus salve a Rainha”. Também, o da Jordânia: “Vida longa ao rei! Vida longa ao rei! Sua posição é sublime, suas bandeiras tremulam em suprema glória”.

     Há também os hinos com tom religioso, como o hino das Ilhas Salomão: “Deus salve nossas Ilhas Salomão (...) abençoe todo seu povo e suas Terras com suas mãos protetoras. Alegria, paz, progresso e prosperidade; faça com que as nações vejam que os homens deveriam ser todos irmãos(...)”.

     A Austrália, por exemplo, é um dos países que cantam suas belezas: “Australianos alegremo-nos todos, por nós sermos jovens e livres; nós temos rica e áurea terra a labutar, nossa terra é cingida pelo mar. Nossa terra abunda em dons naturais, de beleza rica e rara (...)”.

     Alguns países enfatizam suas lutas, o caráter bélico da nação. Não me é nem um pouco confortável ouvir, no hino nacional da França: “Às armas cidadãos! Formai vossos batalhões! Marchemos, marchemos! Nossa terra do sangue impuro se saciará!”.

     Tampouco gosto de ouvir “Às armas! Às armas! Sobre a terra sobre o mar. Às armas! Às armas! Pela pátria lutar! Contra os canhões marchar, marchar!” no hino nacional de Portugal.

     É de estremecer esse trecho do hino nacional da Argélia: “Somos soldados em combate pela verdade, e por nossa independência lutamos. Quando falamos ninguém nos ouviu, então adotamos o som da pólvora para nosso ritmo, e o som das armas como nossa melodia (...)”.

     “Levantai-vos! Vós que recusais a escravatura! Com o nosso sangue e carne construiremos uma nova Grande Muralha! (...) Em desafio ao fogo inimigo, marcharemos!(...)” – diz “A Marcha dos Voluntários”, o hino da China.

     Essas coisas que fazem jorrar sangue, as de espírito segregacionista, do politicamente perfeito, já não mais condizem com os novos tempos, com o espírito humanitário que deve imperar nas relações entre as nações (coletivamente), e entre as pessoas (individualmente) - sejam elas de que cidade ou parte do mundo forem.

     Gosto do hino nacional brasileiro, em especial quando diz “teus risonhos, lindos campos têm mais flores”; ou “Brasil, de amor eterno seja símbolo”;   ou ainda “Paz no futuro e glória no passado”. É bonito, é dócil. Dá leveza, dá uma sensação de harmonia, mostra símbolos suaves como o sorriso dos campos, pelas flores, o amor eterno que desejamos, e o ideal da paz que aspiramos para todos os tempos.

     Mas hoje, passeando no blog da minha amiga Dorcília, me detive na letra do hino de minha cidade natal. Fiquei emocionado. Ouvi o hino seguidas vezes. Ele exalta valores universais e imateriais que, de fato, têm de sobra em Guará: o canto de pássaros, o carinho, a ternura, sentimentos fortes... Conheço seu compositor, e conheci seu arranjador – tive o privilégio de ser aluno e vizinho de ambos: eles próprios, assim como o Paulinho Branco, seu intérprete, traduzem tudo o que está representado no Hino de Guará.
 ("Canção para Guará" - adotada por lei como Hino de Guará)
     Fico imaginando que esse hino singelo, de uma cidade pequena, de uma gente simples, carinhosa, pode servir de alerta para novos valores em tempos de globalização, de competição desenfreada e padronização de mercados; ele propõe um novo modelo que faz com que os laços humanitários se sobreponham sobre as disputas, as vaidades, os interesses e divisões territoriais, tanto pela mensagem contida na letra quanto pela melodia. 

     Belíssimo hino: orgulho-me dele.


*Pesquisa de letras de hinos em: BERG, Tiago José. HINOS DE TODOS OS PAÍSES DO MUNDO. 1ª Ed. São Paulo: Panda Books, 2008
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CANÇÃO PARA GUARÁ
(Por Lei Municipal, “Hino de Guará”)
Letra e Música: Prof. Joaquim Aparecido Martins
Arranjo Musical e harmônico: Maestro Arthur Afonso Bini  

Quero cantar uma canção tão amorosa,
Tão carinhosa, como não há.
Quero cantar com uma voz doce e plangente,
Suave e quente, como a gente de Guará.

Terna cantiga do coração
De um povo irmão como não há.
Quero cantar como os pardais de madrugada
A terra amada desta gente de Guará.

Quero encantar o coração da juventude
Com a virtude que temos cá.
Que é ter no peito um coração como lareira
Da hospitaleira gente amada de Guará.

Cidade amiga, fértil torrão
Nesta região, igual não há.
Quero cantar com emoção nossa riqueza,
Nossa beleza, gente amada de Guará.  

(RP, 24mai2011)

11 comentários:

  1. Envergonhada, confesso minha ignorância em desconhecer o Hino da minha terra. Assim como você, me emocionei, ouvi várias vezes, li e constatei como é pura e singela a poesia feita pelo meu amado e querido professor Joaquim. A melodia me lembrou o vento calmo e o balançar preguiçoso das árvores da ruas da minha cidade e do balanço das folhas das macaubas no cerrado,hoje inexistente. Grata, Elias, pela lição de cidadania e pela oportunidade de colocar-me em contato com esta preciosidade. Beijos!!!

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  2. Olá, querido amigo...
    Como já te disse, seus comentários alegram meu blog, bem como vir aqui e ler seus posts também...
    Um ótimo dia pra vc!

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  3. Cleu, sempre gosto de ler seus comentários. O hino é de fato bonito... emociona mesmo... pela singeleza, inclusive. Vamos aprendendo juntos... Abraços, ELIAS

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  4. Obrigado, Bia, por sua visita. Vamos, com tudo isso, tentando conhecer um pouco mais das coisas.... Mais uma vez, obrigado.

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  5. Avé Maria, que cançãozinha linda e dolente, amei; diferente de outros hinos, sem conotação pilítica alguma, apenas valorizando seu povo, sem ufanismo. Alba.

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  6. Caro Elias, já conhecia de anos atrás, mas estava no esquecimento no bau de minha mente. Obrigado por nós lembrar do hino tão bonito e de muito bom gosto. Parabéns a você , pela iniciativa e aos autores, o nobre Prof. Joaquim e homenagens póstumas ao maestro Bini.

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    1. Obrigado, Gilson, pelos seus comentários que tanto nos ajudam a enriquecer as histórias de Guará e de tanta gente que lá viveu e que tão bem conhecemos. Grande abraço.

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  7. O professor Joaquim, já à época da composição de seu hino, compreendia o caráter não belicoso e hegemônico que deve ter a música que homenageia e exalta as características de um povo alegre, pacífico e acolhedor, como é o de Guará. Com seus apelidos curiosos e bicicletas no asfalto, vez por outra chama a atenção de quem passa por aqui, ou curiosos repórteres de TV. Parabéns, professor das torradinhas, prof. Joaquim, arranjador, cantor, e a você, Elias, que tão bem percebe a alma de nosso povo, exaltando as belezas de nossa terra em seu blog!

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    1. De fato o nosso professor traduziu muito bem a visão romântica e amistosa que todos nós temos de Guará. Obrigado Lucas por visitar o blog e postar aqui seus comentários. Grande abraço.

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  8. Meu caro amigo Elias, obrigado por esse passeio poético, pelas lembranças da infância e pela releitura e interpretação desse nosso maravilhoso Hino, composto com todo o cuidado fonético que era o símbolo do nosso eterno "Professor Joaquim Martins"entoado pelo mais querido maestro que essa cidade já tanto admirou...Parabéns pelo teu belo texto e que continue sempre a nos brindar com relíquias e pérolas da nossa amada cidade bem como dos cidadãos que aqui vivem e viveram com a dignidade e a bondade que nos é peculiar. abraços!!!

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  9. Olá, Wildon. Que alegria ler um comentário seu. Obrigado. O Hino de Guará, que na verdade nasceu canção, é mesmo muito bonito. E essa beleza, sinto, está em sua simplicidade, em seu jeito interiorano de soar - que bem aprendemos a identificar. E assim como símbolo tornou-se a "canção", símbolo também são o Professor e o Maestro. Grande abraço. E, mais uma vez, obrigado.'.

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